STJ decide que proteção legal do bem de família é afastada por violação da boa-fé

Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ a regra da impenhorabilidade do bem de família não pode ser aplicada quando há violação do princípio da boa-fé objetiva. O colegiado negou recurso das proprietárias de um apartamento que invocavam a impenhorabilidade do bem de família oferecido em alienação fiduciária como garantia de empréstimo para empresa pertencente a uma das donas do imóvel.

No caso, uma das proprietárias do imóvel fez um empréstimo no banco no valor de R$ 1,1 milhão, com o objetivo de formar capital de giro na empresa da qual é a única dona. Ela ainda ofereceu como garantia o imóvel que possui em conjunto com outra pessoa e ambas assinaram o contrato de alienação fiduciária.

A empresária deixou de pagar as parcelas do empréstimo, com isso o banco entrou com o pedido de execução da garantia. Para não perder o imóvel, as proprietárias propuseram ação cautelar e, por meio de liminar, conseguiram afastar temporariamente as consequências do inadimplemento.

Em primeira instância, o pedido de nulidade do contrato de garantia foi julgado improcedente e a liminar concedida anteriormente foi cassada. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) manteve a sentença por entender que o acordo jurídico foi firmado em pleno exercício da autonomia dos envolvidos e sem nenhum defeito que o maculasse.

No recurso especial apresentado ao STJ, as recorrentes alegaram que uma das proprietárias do imóvel não é sócia da empresa e não teria sido beneficiada pelo empréstimo. Elas pediram o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel, por ser bem de família, e a declaração de nulidade da hipoteca instituída sobre ele.

O ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso, destacou que a jurisprudência do STJ reconhece que a proteção legal conferida ao bem de família pela Lei 8.009/1990 não pode ser afastada por renúncia do devedor ao privilégio, por ser princípio de ordem pública que prevalece sobre a vontade manifestada.

Mas, segundo ele, a regra de impenhorabilidade aplica-se às situações de uso regular do direito. “O abuso do direito de propriedade, a fraude e a má-fé do proprietário devem ser reprimidos, tornando ineficaz a norma protetiva, que não pode conviver, tolerar e premiar a atuação do agente em desconformidade com o ordenamento jurídico”, observou.

Decisão inovadora

Para Ana Carla Harmatiuk Matos, advogada e diretora nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a decisão bem denota como o Direito segue em movimento, dinamicamente construindo, mediante os julgados antecedentes, os vetores para uma jurisprudência que harmonize as regras das leis específicas com a principiologia de índole constitucional.

Para ela, a função teleológica da Lei 8.009/90 é uma proteção que é fundada em razões de ordem sociológica. Desse modo, procura garantir às famílias, ou a pessoa singularmente, daqueles em dificuldades econômicas um modo de saldar suas dívidas em condições mínimas de sobrevivência digna, garantido-lhes patrimônio mínimo.

“A lei visa a evitar que o credor, usando da lei e da estrutura judiciária para a satisfação de um crédito – um direito de simples expressão patrimonial – alcance ao extremo ético de condenar o devedor, e sua família, ao desabrigo e a falta de condições mínimas de existência”, destaca.

Ela diz que inclusive não se afigura possível a renúncia válida do benefício, quando o devedor citado nomeia o bem de família à penhora, ou se o exequente nomeia o bem de família à penhora, mesmo que o devedor concorde expressamente com a nomeação, restringe-se, assim, a autonomia que poderia estar contaminada por sua vulnerabilidade.

“Contudo, destaque-se, que hipótese notoriamente diversa é agora analisada. Segundo o noticiado uma das proprietárias do apartamento pegou emprestado o valor de R$ 1,1 milhão do banco, com o objetivo de formar capital de giro na empresa da qual é única dona. Neste contrato, ofereceu como garantia o imóvel que possui com outra pessoa, ambas assinando voluntariamente o contrato de alienação fiduciária. Trata-se, portanto, de contrato a ser interpretado segundo as normas de regência e a principiologia das relações obrigacionais”, afirma.

Responsabilidade patrimonial

A diretora nacional do IBDFAM destaca que a indicação voluntária do imóvel se deu no momento de formação do vínculo obrigacional, ausente naquele momento a premência de se saldar dívidas.

“Tratou-se de uma liberalidade na busca de empréstimo para investimento em negócio próprio, razão pela qual utilizou-se de um negócio jurídico de transmissão condicional -, sendo expressa e clara a cláusula de transferência da propriedade para que o banco tenha a garantia do pagamento”, destaca.

Assim, a restrição à responsabilidade patrimonial não pode ser abrigo para, em sua utilização abusiva, abarcar condutas as quais denotam violação ao princípio da boa-fé objetiva, configurando-se em uma distorção ética da própria razão de ser da lei de impenhorabilidade do bem de família.

“Concordo com a decisão pois acredito que a proteção do patrimônio mínimo do devedor não pode ser tutelado se ausente o padrão ético de conduta das partes nas relações obrigacionais, desvirtuando-se os objetivos traçados pelo espírito da lei da impenhorabilidade do bem de família. Deve-se na sua interpretação também primar pela honestidade, lealdade e probidade nas relações obrigacionais”, afirma.

Fonte: IBDFAM

Projeto do Senado pune cônjuge que omite bens em partilha de separação

Tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado um projeto de lei que determina que cônjuge que sonegar bens da partilha de dissolução do casamento perderá o direito sobre eles (PL 2.452/2019). A proposta, da senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), aguarda designação do relator.

A proposta altera o Código Civil estabelecendo que, comprovada a prática de atos de sonegação, o cônjuge prejudicado terá o direito de ficar com o bem sonegado. Segundo Soraya Thronicke, o ordenamento jurídico brasileiro é omisso em relação a essa prática, não prevendo uma sanção específica na esfera cível.

A senadora argumenta que o projeto é inspirado no artigo 1.992 do Código Civil, que prevê que aquele que sonegar bens de herança, omiti-los ou deixar de restituí-los perderá o direito sobre eles.

Soraya argumenta que é preciso dar àquele que “conspurca a partilha havida por dissolução do casamento” uma punição análoga, que é a perda total de direitos sobre o bem objeto do ato fraudulento. “Antevemos que a sombra de uma prescrição legal semelhante pairando sobre esses potenciais trapaceiros há de servir como um eficiente inibidor dos atos ilícitos que porventura estejam a cogitar”, justifica a autora.

FONTE: Agência Senado

A ilegalidade das escrituras de união poliafetiva

Símbolo de um suposto “novo Direito de Família” brasileiro, as chamadas escrituras de uniões poliafetivas ganharam o noticiário até mesmo internacional. É claro que a divulgação escapou para o trágico: o Brasil aceita a poligamia, disseram veículos como Le MondeEl País e La Stampa1.

Na verdade, o Direito brasileiro não tutela uniões poligâmicas, e as escrituras que reconhecem efeitos jurídicos de união estável – pessoais e patrimoniais – a relações entre mais de duas pessoas são ilegais. Pela ordem constitucional (art. 226, §3º) e infra (CCB/02, art. 1.723) a monogamia é essencial ao reconhecimento de união estável2.

Argumentar com a ideia de que tais escrituras apenas constatam a existência fática de tais arranjos, declarando-os, é no mínimo temerário. O cidadão enxerga na escritura pública a chancela estatal que tal documento de fato carrega. A constatação de algo que é “quase jurídico” ou “em vias de tornar-se jurídico” fere qualquer compromisso entre o agente (tabelião) e o cidadão. As uniões poliafetivas não são jurídicas, e não podem atrair efeitos de Direito de Família.

Uma eventual reforma legislativa com o propósito de admitir a juridicidade dessas relações teria de modificar diversos aspectos do ordenamento, para evitar contradições. Por exemplo: a união estável, como se sabe, pode ser convertida em casamento. Se se reconhece como “união estável” uma relação entre três pessoas, é necessário admitir que essa mesma relação seja convertida em casamento. Estar-se-ia, então, diante de uma espécie de bigamia excepcionalmente autorizada? Essa e outras contradições revelam, também em uma visão sistemática, a não admissão da figura da união jurídica poliafetiva.

Em vista da gravidade do problema, há um pedido de providências feito ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pela Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS) para que o órgão explicite aos titulares e substitutos dos Tabelionatos de Notas que tais escrituras não devem ser lavradas. O ministro João Otávio de Noronha, Corregedor Nacional de Justiça, já votou pela procedência desse importante pedido. A questão assume grande relevância social diante da possibilidade de se efetuarem muitas escrituras desse tipo.

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O argumento com que se pretende legitimar esses atos é o mesmo que tem permeado parte substancial dos discursos em Direito de Família no Brasil: o da afetividade. Seria o afeto o elemento garantidor da juridicidade das relações familiares, bem como a chave interpretativa dessas mesmas relações. Com isso, se há uma relação afetiva, ainda que poliafetiva, é viável emprestar efeitos jurídicos, garantindo assim alguma forma de tutela por parte do Estado.

O problema está na inviabilidade de se operacionalizar algo como o afeto. Não se quer com isso desprestigiar os sentimentos. Antes pelo contrário: quer-se indicar que um sistema jurídico é incompatível com elementos tão nobres quanto amor e afeto, cuja compreensão deve ser reservada para estudos próprios, em diversas áreas, e por pessoas com formação específica. Em outros termos: os juristas não sabem e não saberão lidar adequadamente com o afeto. Interpretá-lo em situações reais exigiria uma racionalidade que um tomador de decisões jurídicas não tem.

Essa inviabilidade revela o tom fortemente retórico dos discursos que anunciam uma “virada” compreensiva do Direito de Família a partir da afetividade.

Sem dúvida, as relações familiares experimentaram uma grande mudança desde meados do século XX, principalmente com a contracultura. Uma nova realidade comportamental que atingiu, sem dúvida, o Direito. Mas, as influências específicas que essa revolução criará em Direito de Família (e não na experiência das relações particulares) exigem ainda, como sempre exigirão, uma decisão política. É dizer, variações comportamentais, emergidas a partir da revolução cultural (especialmente), e do “é proibido proibir” – que agora completa meio século – podem impactar decisões políticas legislativas, mas não criam um dever de tutela por parte de qualquer agente estatal sobre todas as “expressões” de comportamento afetivo e sexual.

Relativamente às uniões “poliafetivas” – na verdade uma prática muito antiga, que a civilização abandonou em prol da monogamia – a questão é singela: as pessoas, se quiserem, podem viver uma relação com outras duas, três ou mais. O que não se admite é a juridicidade desse arranjo, porque o Brasil adota a monogamia como pilar constitucional. E somente desloca o aparato estatal para proteger relações entre duas pessoas, caso, é claro, não estejam impedidas de casar (abre-se aqui a discussão sobre os efeitos jurídicos das relações paralelas, o chamado “direito dos amantes”, que certas correntes pretendem ver tuteladas como se fossem família, sempre sob o argumento do afeto). Daí o primeiro grande motivo para rejeitarem-se as escrituras públicas de poliafetividade.

Um outro aspecto, que deveria soar mais óbvio, e que já se adiantou ao início, diz respeito à própria figura do Tabelião de Notas. Agente da máxima importância, a quem o Estado confere o poder de dar fé pública a atos e fatos jurídicos, sua tarefa não pode ser banalizada. Ao reconhecer uma relação que não subsiste juridicamente como família, o notário se afasta do imperativo da legalidade, que lhe preside o ofício.

Realmente, “(…) quando o Tabelião de Notas, portador da fé pública, lavra uma escritura, declarando a existência de relação de três, quatro, cinco ou mais pessoas com direitos típicos da união estável, afirma inveridicamente à sociedade que tais relações entraram no mundo do Direito, que se tornaram relações jurídicas familiares e produzirão todos os efeitos ali mencionados”3.

E chega-se assim a mais um alerta (tempos difíceis nos quais é preciso pedir desculpas para dizer o correto): não se pretende afirmar que o Direito não acompanha as mudanças, ou a realidade das relações humanas. Como dito acima, acompanha deveras, e o direito de família brasileiro está cheio de exemplos disso. A questão relevante reside em saber como se opera esse acompanhamento da realidade.

Quando um determinado autor diz algo como “o Direito não pode fechar os olhos para a realidade das relações familiares”, essa colocação precisa ser compreendida com muito cuidado. Que Direito é esse? Aquela parte da técnica jurídica realizada perante um Tabelião entra nessa noção? É preciso responder com firmeza: não. O Direito que não fecha os olhos à “fértil realidade da vida” é uma referência ao legislador, único que pode manejar a ordem jurídica, pois tem autoridade para isso.

No Brasil, a insistência na ideia de que decisões judiciais, por exemplo, devem levar em conta todos os “valores”, sem apegar-se demasiadamente à “letra da lei”, foi criando um quadro muito problemático. Um substancialismo jurídico-decisório, como dirá Thiago Reis4. Para este autor, “se por trás de toda regra, de todo princípio, de todo instituto ou de toda relação jurídica há sempre uma substância que os legitima e informa, qualquer estrutura pode ser relativizada em nome de uma interpretação que afirme apreender e realizar essa substância”5.

E se todo caso, por mais simples que pareça, deve ser decidido com base na “tábua de valores da Constituição”, retira-se das regras jurídicas sua necessária vinculatividade. Aliás, é o que se tem visto: a própria CF/88 perde sua vinculatividade em nome dos valores a ela supostamente relacionados6.

É aí que entra a tirania do afeto, a alimentar o problema específico analisado no presente texto (“escrituras” de uniões poligâmicas). Se todo o direito de família é baseado no afeto – essa substância – então qualquer regra pode ser afastada para fazer valer tal sentimento.

Em outros termos, também essa ideia de que é possível fazer tais escrituras porque “é o que acontece na realidade da vida” surge como uma expressão – uma entre tantas – do cenário no qual está mergulhado, hoje, o Direito brasileiro. Um verdadeiro vale-tudo para driblar a legislação.

Se se pretende ver a ordem jurídica democrática preservada é preciso afirmar: não há uniões jurídicas poliafetivas. Escrituras que as reconhecem são nulas. E continuarão a ser até que o legislador venha a admitir a figura. É claro que isso dificilmente ocorrerá, afinal uma decisão como essa tem impactos negativos tanto dentro da família quanto fora dela (algo que se pretende discutir melhor numa futura coluna).

Talvez o conhecimento dessa vedação explique a tentativa de forçar a admissão das uniões poliafetivas pela via do ativismo judicial e (mais esta!) extrajudicial. Afinal, se o legislador constituinte não admitiu, basta invocar algum valor e fazer surgir na Constituição algo que lá não se inseriu.

É o momento de se entender que esse pensamento, que derrui o aparato normativo para a obtenção de determinados fins, desestabiliza mais ainda um país institucionalmente frágil e, ao final das contas, piora a vida do cidadão.

Até o próximo Registralhas!

Vitor Frederico Kümpel e Bruno de Ávila Borgarelli

__________

1 Uma exposição das principais manchetes – a maior parte delas em tom pejorativo – pode ser lida em TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Brasil: o país do ‘ménage à trois’. Estadão – Fausto Macedo. 30/4/2018. Acesso em 19/5/2018.

2 CF/88. Art. 226. §3º. “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.

3 TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. CNJ julga pedido de providências para que não sejam lavradas escrituras de poligamia. Estadão – Fausto Macedo. 26/4/2018. Acesso em 19/5/2018. [grifo nosso].

4 Dogmática e incerteza normativa: crítica ao substancialismo jurídico do direito civil-constitucional. Revista de Direito Civil Contemporâneo, vol. 11, ano 4, p. 213-238, abr./jun. 2017.

5 REIS, Thiago. Op. cit., p. 227.

6 Uma denúncia desses problemas foi feita em BORGARELLI, Bruno de Ávila. Crise do Direito Civil encontra focos de resistência – Parte 1. Migalhas. Acesso em 19/5/2018.

Direito Real de Laje: alguns aspectos da proteção legal ao “puxadinho”- BLOG DO DG

O surgimento da Lei nº. 13.465/17, pela conversão da Medida Provisória 759 de 2016 em lei, apresentou diversas novidades. Uma das mudanças instigantes trazida pela lei foi o do direito real de laje.

A proteção foi incluída no rol taxativo de direitos reais (CC/02, artigo 1.225, XIII) e acrescentou-se os artigos 1.510-A a 1.510-E ao Código Civil Brasileiro para tratar do tema. O cuidado as edificações verticais que pela estrutura, muitas vezes irregular em diversos aspectos, ficavam à margem da regularização normativa e administrativa da municipalidade, agora possuem breve regulamentação.

De acordo com as normas inseridas ao Codex Civil, “o direito real de laje consiste na possibilidade de coexistência de unidades imobiliárias autônomas de titularidades distintas situadas nas mesmas áreas” (art. 1.510-A).

No § 1º da convertida Medida Provisória (MP) nº 759/2016 estava expressamente previsto que a aplicação das regras do direito à laje era atrelada a impossibilidade da individualização dos lotes, a sobreposição ou a solidariedade de edificações ou terrenos. Entendemos que mesmo não estando expresso nas normas da lei civil, continua implícito este raciocínio. Em outras palavras, quando de nenhuma outra maneira legal e administrativa prevista para individualização o imóvel puder ser aplicada, será possível utilizar dos regramentos do artigo 1.510-A e seguintes do Código Civil. Haja vista que, podendo aplicar-se regramentos de outros institutos plenamente, não haverá necessidade de buscar guarida no direito real de laje.

Pela norma do caput do artigo 1.510-A, resta claro que a laje terá uma matrícula individual no cartório de imóveis (confirmado pelo § 3º do artigo 1.510-A do CC/02, trazendo o cumprimento ao princípio da unicidade matricial, que é o fundamento da abertura da matrícula individual de cada imóvel) para cumprir a regra da norma do artigo 224 da Lei de Registros Públicos – LRP (6.015/73). Esta possibilidade insere o imóvel no âmbito das relações de comércio; tornando o bem passível de ser dado em garantia, ser alienado livremente ou até mesmo ser usucapido. Além disso, possibilita a cobrança pelos entes políticos dos tributos inerentes ao imóvel sobreposto (IPTU, Taxa de coleta de lixo domiciliar, por exemplo), bem como, os impostos incidentes nas transmissões patrimoniais inter vivos ou mortis causa.

No âmbito constitucional, vimos que esta lei veio colaborar com o direito à moradia (previsto no artigo 6º da CF/88). Percebe-se que as pessoas de baixa renda que estão estabelecidas nestes moldes de moradia, serão especialmente beneficiadas por essa normativa.

Para aplicação do direito real de laje (terminologia legal), deve-se atenção as exigências legais. Não sendo observadas tais normas, não será possível o registro no cartório de imóveis. Um dos principais requisitos impeditivos é o terceiro titular da laje não pode prejudicar a segurança ou mesmo a estrutura arquitetônica ou estética do imóvel-base, devendo observar as ordens previstas na lei local.

O artigo 1.510-D do CC/02 nos apresenta o direito de preferência do titular do térreo ou construção-base, que devidamente notificado (judicial ou extrajudicial) se manifeste dentro do prazo mínimo de trinta dias, salvo outra disposição, a respeito do interesse de aquisição do imóvel sobreposto. Deve-se atenção também às outras preferências trazidas pelo § 2º deste artigo acerca do direito de sucessão de preferência. Não há impossibilidade da instituição do direito real de laje sucessivo (§ 6º do art. 1.510-A, CC/02), como era impedida pela convertida Medida Provisória nº 759/2016 (“…não podendo o adquirente instituir sobrelevações sucessivas…”).

O artigo seguinte (CC/02, art. 1.510-E) prevê a aplicação da teoria gravitação jurídica, pois, sendo o imóvel sobreposto um acessório do imóvel-base (principal), este o seguirá em caso de eventual ruína.

O aspecto registral está vislumbrado no recente inserido § 9º do artigo 176 da Lei de Registros Públicos (6.015/73), que prevê a instituição do direito real de laje através da abertura da matrícula individualizada no registro de imóveis e das comunicações reciprocas nas matrículas provenientes ou das construções envolvidas.

Entendemos que a melhor maneira de instituir este direito real de laje será através da escritura pública de instituição, lavrada por tabelião dotado de fé pública ou por meio do instrumento particular com força de escritura pública. O legislador apresentou a possibilidade de aplicação, no que couber, das normas inerentes aos condomínios edilícios (art. 1.510-C do CC/02). Os titulares do imóvel-base e do sobreposto estão livres para dispor no instrumento as regras de divisão de despesas para manutenção da estrutura, bem como, os direitos e deveres, as penalidades e demais cláusulas que entenderem cabíveis.

O oficial de registro de imóveis deve fazer o juízo de admissibilidade do título submetido ao registro (LRP, art. 225), no sentido de verificar as especificações das áreas de cada unidade imobiliária, seus cômodos e confrontações, bem como a legitimidade e qualificação dos titulares ali apresentados, com finalidade de individualizar a realidade ao registro imobiliário (conforme os princípios registrais da especialidade objetiva e da concentração). Detectando mínima divergência entre o registro e o título apresentado, está obrigado a fazer exigir as retificações necessárias no fólio real para enquadrar as realidades.

Enfim, estes foram alguns aspectos da novidade, acreditamos que outras boas ideias surgirão no meio jurídico sobre aplicação deste direito real restrito a construção-base. Aguardemos!

Pedro Luís Teobaldo de Fontes

Especialista em Direito Notarial e Registral. Autor de livro

FONTE: Blog do DG

Sucessão Provisória não tem ingresso no Registro de Imóveis

Registro de Imóveis – Sucessão Provisória – Ingresso do título no fólio real condicionado à sucessão definitiva – Negativa de registro da escritura de compra e venda celebrado pela viúva meeira e herdeiros em atenção ao princípio da continuidade – Formal de partilha – Documentos pessoais das partes – Apresentação ao Tabelião que não supre a omissão apontada nos títulos prenotados junto à serventia imobiliária – Manutenção dos óbices apontados pelo registrador – Dúvida julgada procedente – Apelação não provida.

[…]

Como se vê, na sucessão provisória os herdeiros ainda não têm a propriedade definitiva dos bens, o que é incompatível com a segurança que se exige do registro de imóveis. Por essa razão, o ingresso no fólio real fica condicionado à sucessão definitiva, conforme já decidido por este Egrégio Conselho Superior, nas Apelações Cíveis nº 093.962-0/5 e nº 99010515.250-3.

Até lá, o caráter provisório da transmissão fica ainda mais evidente por força do disposto no art. 31 do Código Civil, que veda a alienação dos imóveis do ausente, salvo nas hipóteses específicas ali estabelecidas. Em outras palavras, os herdeiros não possuem plena disponibilidade dos imóveis.

A conversão da sucessão provisória em definitiva dá-se por sentença, a requerimento dos interessados, o qual poderá ser feito somente dez anos após o trânsito em julgado da sentença que deferiu a abertura da sucessão provisória.  No caso concreto, porém, tendo sido o formal expedido nos autos do procedimento de sucessão provisória, sem apresentação da sentença declaratória da sucessão definitiva (Código Civil, art. 37), inviável o registro. […]

CSMSP – APELAÇÃO CÍVEL: 1003262-94.2017.8.26.0114
LOCALIDADE: Campinas DATA DE JULGAMENTO: 25/04/2019 DATA DJ: 23/05/2019. RELATOR: Geraldo Francisco Pinheiro Franco.

Fonte: Kollemata

Teoria da Causalidade Alternativa

Foto ig @cartorionofoco

O que é a Teoria da Causalidade Alternativa no Direito Civil?

Trata-se de uma técnica de responsabilização decorrente de danos causados por objetos caídos ou lançados de um prédio, “pela qual todos os autores possíveis – isto é, os que se encontravam no grupo – serão considerados, de forma solidária, responsáveis pelo evento, em face da ofensa perpetrada à vítima por um ou mais deles, ignorado o verdadeiro autor, ou autores. ” (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 6ª edição. São Paulo: Malheiros, 2006, pág. 246.) Tal responsabilidade é objetiva, e não admite como excludentes a força maior e o caso fortuito.

Art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido. (CC/02)

Na hipótese de danos causados por objetos caídos ou lançados de um condomínio edilício, não sendo possível identificar o agente, todo o condomínio será responsabilizado.

Haverá, no entanto, direito de regresso contra o real causador do dano identificado posteriormente. Não sendo possível a identificação do condômino responsável, os prováveis causadores do dano poderão ser acionados na ação de regresso.

REsp 64682 / RJ . Ementa. RESPONSABILIDADE CIVIL. OBJETOS LANÇADOS DA JANELA DE EDIFÍCIOS. A REPARAÇÃO DOS DANOS É RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO. A impossibilidade de identificação do exato ponto de onde parte a conduta lesiva, impõe ao condomínio arcar com a responsabilidade reparatória por danos causados à terceiros. (…) Recurso não conhecido.


Fonte: LFG – Jusbrasil.