TJ/SC: Área pública, confirma Tribunal de Justiça, não pode ser objeto de ação de usucapião

TJSC confirmou decisão que negou pleito de usucapião extraordinário formulado por um cidadão em relação a terreno público de 300 metros quadrados, onde inclusive já havia edificado uma residência e garantia morar há mais de 30 anos.

5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) confirmou decisão que negou pleito de usucapião extraordinário formulado por um cidadão em relação a terreno público de 300 metros quadrados localizado no bairro Jardim América, pertencente ao município de Chapecó, onde inclusive já havia edificado uma residência e garantia morar há mais de 30 anos.

No recurso, a defesa argumentou que o imóvel foi adquirido de terceiros e de maneira direta. Para o desembargador Vilson Fontana, relator da matéria, é irrelevante o fato de a municipalidade não ter conferido qualquer destinação ao imóvel ou mesmo ter tolerado que os particulares dele se utilizassem e lá edificassem suas residências. O fato é que um imóvel público só perde essa característica se vendido pelo município, mas nunca pela ociosidade.

Dessa forma, fica claro que o poder público pode retomar a posse direta sobre o bem a qualquer tempo. No entanto, é importante dizer que qualquer um pode buscar a aquisição de um bem público desde que pague a quantia correspondente (Autos n. 0303909-84.2017.8.24.0018).

Fonte: IRIB

1VRP/SP: Registro de Imóveis. Penhora não impede a usucapião extrajudicial

Processo 1118113-23.2019.8.26.0100

Dúvida – REGISTROS PÚBLICOS – 2º Oficial de Registro de Imoveis da Capital – Renata dos Santos – – Comercial & Serviços JVB S/A – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 2º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Comercial e Serviços JVB S/A, após o Oficial ter julgado infundada impugnação apresentada pela suscitada em pedido extrajudicial de usucapião formulado por Renata dos Santos. Narra o Oficial que a requerente do pedido extrajudicial, Renata, pretende a declaração de usucapião extraordinária do imóvel matriculado sob o nº 129.666 na mencionada serventia. Iniciado o procedimento extrajudicial, foi apresentada impugnação pela suscitada Comercial e Serviços JVB S/A, beneficiária de penhora devidamente averbada na matrícula, aduzindo que a penhora impede o pedido de usucapião, além de alegar que há fraude à execução, por não terem sido preenchidos os requisitos para usucapião. O Oficial julgou a impugnação infundada, por entender que a penhora não impede a transmissão do imóvel (fl. 89). De tal decisão recorreu o impugnante (fls. 90/93). A requerente Renata dos Santos manifestou-se às fls. 95/104, aduzindo que a penhora não impede a usucapião e que não há fraude a execução. A impugnante manifestou-se às fls. 108/113, reiterando os argumentos anteriores. O Ministério Público opinou às fls. 133/134 pela improcedência da impugnação. É o relatório. Decido. De início, quanto a manifestação do D. Promotor relativa à natureza do presente procedimento, entendo que, apesar da semelhança com o pedido de providências relativo a impugnação de pedido de retificação de registro, a análise da impugnação em procedimento extrajudicial de usucapião deve se dar como dúvida, já que o §7º do Art. 216-A da Lei 6.015/73 prevê a dúvida como procedimento a ser adotado “em qualquer caso”. Dito isso, pontuo como correto o entendimento adotado pelo Oficial quanto a inexistência de impedimento, fundado na existência de penhora, para o pedido de usucapião. Neste sentido, o Art. 14 do Prov. 65/17 da Corregedoria Nacional de Justiça é expresso: Art. 14 – A existência de ônus real ou de gravame na matrícula do imóvel usucapiendo não impedirá o reconhecimento extrajudicial da usucapião. E não poderia ser diferente, já que a usucapião, por se tratar de forma originária de aquisição da propriedade, não pode ser limitada por relação jurídica estabelecida pelo titular de domínio com terceiro, já que da forma originária decorre justamente a inexistência de vínculo entre a aquisição de propriedade e as antigas relações jurídicas dela decorrentes. Não obstante, o procedimento de usucapião extrajudicial tem como principal requisito a inexistência de lide, de modo que, apresentada qualquer impugnação, a via judicial se torna necessária, nos termos do §10º do Art. 216-A da Lei 6.015/73. Não por outra razão, o parágrafo único do citado Art. 14 do Prov. 65/17 impede o prosseguimento do pedido extrajudicial caso o titular do direito impugne o pedido. Cito: Parágrafo único. A impugnação do titular do direito previsto no caput poderá ser objeto de conciliação ou mediação pelo registrador. Não sendo frutífera, a impugnação impedirá o reconhecimento da usucapião pela via extrajudicial. Não se pode negar que, mesmo que a penhora não seja suficiente para impedir o pedido, seu registro regular gera interesse ao beneficiário, que pode impugnar a usucapião. E, como expresso em norma do CNJ, tal impugnação veda o prosseguimento extrajudicial. Aqui, pontuo que as NSCGJ do Tribunal de Justiça de São Paulo, em seu item 418.19.1, inserido no Cap. XX, alterou a redação da norma do CNJ em âmbito estadual, ao dispor que, não sendo frutífera a conciliação, será adotado o rito do item 420, que diz respeito justamente a possibilidade de análise, pelo Oficial e pelo Corregedor Permanente, da pertinência da impugnação. Assim, em um primeiro momento, se analisada a impugnação tão somente no fundamento de existência de penhora, esta deveria ser afastada, como feito pelo Oficial, pelas razões já expostas. Ocorre que a impugnação não se limita a tal fundamento: o impugnante alega que há fraude à execução, havendo comodato e acordo entre proprietário e requerente para impedir o leilão do bem. E quanto a esta espécie de fundamento, já decidiu este juízo no Proc. 1099413-96.2019.8.26.0100: As Normas de Serviço da Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo, prestigiando a qualificação do Oficial de Registro e a importância do procedimento extrajudicial, trouxeram pequena flexibilização a tal regra no item 429 do Cap. XX, permitindo que seja julgada a fundamentação da impugnação, afastando-se aquelas claramente impertinentes. Como bem demonstra o item 429.5 do mesmo capítulo, tal julgamento deve se dar de plano ou após instrução sumária, não cabendo ao Juiz Corregedor Permanente permitir a produção de prova para que se demonstre a existência de óbice ao reconhecimento da usucapião. É dizer que, apresentada impugnação, deve-se apenas verificar se seu caráter é meramente protelatório ou completamente infundado. Havendo qualquer indício de veracidade, que justifique a existência de conflito de interesses, a via extrajudicial se torna prejudicada, devendo o interessado ingressar com pedido judicial, sem prejuízo de utilizar-se dos elementos constantes do procedimento extrajudicial para instruir o pedido. E, para fins de analisar-se se fundamentada ou não a impugnação, cumpre citar o item 429.2 do Cap. XX das NSCGJ: 429.2. Consideram-se infundadas a impugnação já examinada e refutada em casos iguais ou semelhantes pelo juízo competente; a que o interessado se limita a dizer que a usucapião causará avanço na sua propriedade sem indicar, de forma plausível, onde e de que forma isso ocorrerá; a que não contém exposição, ainda que sumária, dos motivos da discordância manifestada; a que ventila matéria absolutamente estranha à usucapião; e a que o Oficial de Registro de Imóveis, pautado pelos critérios da prudência e da razoabilidade, assim reputar. E a impugnação apresentada não se encaixa nas hipóteses acima previstas. Não se trata de impugnação cujo fundamento seja questão específica já analisada por este juízo, tampouco de hipótese de avanço sobre a propriedade, uma vez que os impugnantes não são confrontantes. Do mais, há exposição sumária dos motivos de discordância, sendo que a petição traz questões referentes a existência de comodato (…), que não poderia ser comprovado na via extrajudicial, sendo a via judicial adequada para que se exerça a ampla dilação probatória com respeito ao contraditório e ampla defesa, salientando-se que a possível existência do comodato verbal é prejudicial ao pedido de usucapião, pois afasta a posse com animus de proprietário. (.,..) [N]ão cabe a este juízo analisar o mérito da impugnação, mas apenas a existência de fundamentação mínima que demonstre a existência válida de impugnação ao pedido. E tal requisito foi preenchido no presente feito, cabendo ao juízo comum analisar se verdadeiras ou não as alegações. Em suma, havendo plausibilidade nas alegações, o feito deve ser extinto e as provas produzidas judicialmente. Saliento que, sendo remetidos os autos a via judicial com tais fundamentos e, eventualmente, sendo reconhecido pelo juiz competente que estes não tinham qualquer base fática, sendo a impugnação meramente protelatória, nada impede a imposição de multa processual por litigância de má-fé contra a impugnante, mas tal questão há de ser decidida na ação judicial. Destaco, por fim, que ao declarar fundamentada a impugnação não se está afirmando sua veracidade, ou que inexiste o direito a usucapião, mas apenas que o prosseguimento na via extrajudicial está obstado. Em suma, entendo que a análise do Oficial, quanto a penhora em si, estava correta, mas a impugnação não foi enfrentada inteiramente, sendo que os demais argumentos, relativos a inexistência de animus domini, estão minimamente justificados na alegação de fraude a execução, o que impede o seguimento do pedido extrajudicial. Destaco, novamente, que não se está julgando aqui o mérito do pedido e da impugnação (a existência, ou não, do comodato ou da fraude), mas apenas que a impugnação é minimamente plausível para os fins de impedir o prosseguimento administrativo do feito, já que devidamente caracterizada a lide. Com o trânsito em julgado da presente dúvida, os autos retornarão ao Oficial de Registro, que dará baixa na prenotação e lavrará relatório do processado, cabendo ao interessado, se assim entender pertinente, requerer a retomada do procedimento judicial, podendo aproveitar tudo aquilo que processado perante a serventia extrajudicial, nos termos do decidido no Proc. 1000162-42.2018.8.26.0100. Destaco que, apesar dos benefícios do procedimento extrajudicial e de ser louvável a opção realizada pela requerente de suspender o pedido judicial, a existência de impugnação exige que o prosseguimento continue judicialmente. Do exposto, julgo procedente o presente feito, julgando fundamentada a impugnação apresentada por Comercial e Serviços JVB S/A no pedido extrajudicial de usucapião que corre perante o Oficial do 2º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Renata dos Santos, determinando o retorno dos autos ao Oficial de Registro de Imóveis, que deverá arquivar o feito e cancelar a prenotação, cabendo ao interessado retomar o procedimento judicial se assim entender pertinente, podendo aproveitar-se dos documentos produzidos extrajudicialmente. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. – ADV: JOSÉ ROBERTO NEVES FERREIRA (OAB 384996/SP), MICHELLE PINTO ALENCAR DE FIGUEIREDO (OAB 293679/SP), JULIO CESAR DE ALENCAR BENTO (OAB 338896/SP), WESLEY EDSON SOARES DE MENDONCA (OAB 420776/SP)

Fonte: DJE/SP 10.02.2020

1VRP/SP: Usucapião Extajudicial. Há necessidade de apresentação da ata notarial

Processo 1114209-92.2019.8.26.0100

Dúvida – Notas – Ismael Francisco Mota Siqueira Guarda e outros – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 1º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ismael Francisco Mota Siqueira Guarda e outros, após negativa de prosseguimento de pedido extrajudicial de usucapião do imóvel matriculado sob o nº 87.257. O óbice diz respeito à necessidade de apresentação de ata notarial, tendo o Oficial se baseado na exigência da Lei 6.015/73, bem como precedente deste juízo. Os suscitados, apesar de não se manifestarem neste procedimento (fl. 560), argumentaram perante a serventia extrajudicial (fls. 04/09) que a ata notarial é facultativa e pode ser substituída por outras diligências realizadas pelo Oficial. Vieram aos autos os documentos de fls. 10/552. O Ministério Público opinou às fls. 564/566 pela procedência da dúvida. É o relatório. Decido. Este juízo já teve oportunidade de se manifestar sobre a exigência de ata notarial. Cito o decidido no Proc. 1002887-04.2018.8.26.0100: A usucapião extrajudicial foi medida adotada pelo legislador visando desburocratizar o reconhecimento da prescrição aquisitiva, tendo em vista que o procedimento judicial demanda diversas etapas que levam ao decurso de um longo tempo para o provimento do pedido. Previu-se, assim, que nos pedidos de usucapião em que não haja impugnantes, pode o requerente solicitar, perante o Cartório de Registro de Imóveis competente, o reconhecimento da aquisição da propriedade. Contudo, a alteração legal se deu quanto aos procedimentos necessários para tal reconhecimento, não se alterando a essência da usucapião, instituto previsto tanto nos Arts.183 e 191 da Constituição Federal quanto nos Arts. 1.238 e seguintes do Código Civil. Desta feita, são previstas diversas modalidades de usucapião, sendo a posse mansa e pacífica requisito de todas elas, e o justo título requisito da usucapião ordinária. A comprovação de tais requisitos é, portanto, essencial para a procedência do pedido, independentemente do procedimento adotado. Destarte, também na usucapião administrativa esta comprovação deve ser feita. E a forma para tal não é livre: estando em jogo o direito de propriedade, a prova há de observar as exigências legais, sob pena de haver uma simplificação excessiva que coloque em risco a propriedade de terceiros. Em outras palavras, a observância dos preceitos legais é essencial para a segurança jurídica esperada do procedimento administrativo, não sendo possível ao requerente optar pela forma em que demonstrará a posse e o justo título. Assim, ainda que se discorde dos meios exigidos pelo legislador (como a ineficácia da ata notarial para atestar a existência da posse e seu tempo), são eles garantias de que a usucapião foi reconhecida de modo legítimo, declarando-se a propriedade do usucapiente em prejuízo do proprietário tabular sem qualquer dúvida que possa contaminar a legitimidade do procedimento. Portanto, as exigências legais devem ser observadas em sua totalidade, e sua interpretação deve ser restritiva, no sentido de limitar qualquer tentativa de se simplificar o procedimento ou alterá-lo. Como bem exposto pelo D. Promotor: “[O] reconhecimento da prescrição aquisitiva na via extrajudicial já representou a vontade do legislador em desburocratizar tais operações, não cabendo ao suscitado, de seu turno, buscar medida ainda mais simplória, consistente na sua simples declaração.” Aqui, cumpre colacionar o caput do Art. 216-A da Lei de Registros Públicos: “Art. 216-A. Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado, instruído com: I – ata notarial lavrada pelo tabelião, atestando o tempo de posse do requerente e de seus antecessores, conforme o caso e suas circunstâncias, aplicando-se o disposto no art. 384 da Lei no13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil); II – planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado, com prova de anotação de responsabilidade técnica no respectivo conselho de fiscalização profissional, e pelos titulares de direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes; III – certidões negativas dos distribuidores da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente; IV – justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse, tais como o pagamento dos impostos e das taxas que incidirem sobre o imóvel.” Quando o legislador utiliza-se da expressão “instruído com”, está ele determinando os documentos essenciais ao procedimento. Ao contrário do que alegado pelo suscitado, a obrigatoriedade destes documentos, por todo o exposto acima, se presume, e qualquer exceção deve estar prevista em lei ou ato normativo emitido por órgão ou autoridade competente. É o caso, por exemplo, do inciso IV: o §15º do Art. 216-A é expresso ao mitigar a exigência destes documentos que comprovem as características da posse, dispondo que, na sua ausência ou insuficiência, “a posse e os demais dados necessários poderão ser comprovados em procedimento de justificação administrativa perante a serventia extrajudicial”. Outra exceção diz respeito ao inciso II, uma vez que o §5º do Art. 4º do Provimento 65 do CNJ previu que “será dispensada a apresentação de planta e memorial descritivo se o imóvel usucapiendo for unidade autônoma de condomínio edilício ou loteamento regularmente instituído, bastando que o requerimento faça menção à descrição constante da respectiva matrícula.” No caso da ata notarial, contudo, não há exceção. Sua exigência é expressa na lei. E, ao contrário do que quer fazer crer o suscitado, a expressão “conforme o caso e suas circunstâncias” não vem no sentido de afastar a necessidade da apresentação da ata, mas diz respeito ao “tempo de posse do requerente e de seus antecessores”. Ou seja, o tabelião deve atestar o tempo de posse conforme o caso e suas circunstâncias, no sentido de que não há modelo específico de como deverá fazê-lo: observadas as circunstâncias próprias de cada caso, o tabelião pode atestar o tempo de posse de diversas maneiras, como entrevistando vizinhos, analisando documentos ou utilizando-se de outros meios aptos para tanto. Neste sentido o Art. 4º, I, do Provimento nº 65, de 14/12/2017, do Conselho Nacional de Justiça, que prevê o conteúdo da ata notarial, visando justamente clarificar qual o conteúdo necessário para que se atinja os objetivos do procedimento: “Art. 4º O requerimento será assinado por advogado ou por defensor público constituído pelo requerente e instruído com os seguintes documentos: I ata notarial com a qualificação, endereço eletrônico, domicílio e residência do requerente e respectivo cônjuge ou companheiro, se houver, e do titular do imóvel lançado na matrícula objeto da usucapião que ateste: a)a descrição do imóvel conforme consta na matrícula do registro em caso de bem individualizado ou a descrição da área em caso de não individualização, devendo ainda constar as características do imóvel, tais como a existência de edificação, de benfeitoria ou de qualquer acessão no imóvel usucapiendo; b)o tempo e as características da posse do requerente e de seus antecessores; c)a forma de aquisição da posse do imóvel usucapiendo pela parte requerente; d)a modalidade de usucapião pretendida e sua base legal ou constitucional; e)o número de imóveis atingidos pela pretensão aquisitiva e a localização: se estão situados em uma ou em mais circunscrições; f)o valor do imóvel; g)outras informações que o tabelião de notas considere necessárias à instrução do procedimento, tais como depoimentos de testemunhas ou partes confrontantes;” Destaque-se a alínea g), que vem a corroborar o entendimento de que a expressão “conforme o caso e suas circunstâncias” deve ser interpretada no sentido de que ao tabelião é livre a utilização das informações necessárias, em cada hipótese, para melhor instruir o procedimento. E não é só. A exigência da ata notarial, como dito acima, é garantia do Oficial de Registros de Imóveis e de terceiros de que as informações dadas pelo requerente são verdadeiras. Ou seja, não basta a palavra deste para que o registrador reconheça a prescrição aquisitiva, sendo necessário outro meio de prova apta a demonstrar a veracidade das informações. Tal meio, escolhido pelo legislador, é a ata notarial. Corrobora este entendimento a previsão do § 2º do Art. 5º do já mencionado Provimento 65, no sentido de que o Tabelião não pode basear-se apenas na declaração do requerente para lavrar o documento. Tudo isso a fortificar o entendimento de que, dada a natureza da usucapião, não é suficiente o mero requerimento do possuidor e o silêncio do proprietário tabular para seu reconhecimento; são necessários elementos externos, que no caso judicial se dá pela inquirição de testemunhas, perícia judicial e pela própria autoridade do juiz ao utilizar seu convencimento motivado para atestar a posse. Já no caso extrajudicial, este elemento externo é a ata notarial, que, caso afastada, retiraria esta garantia de que os fatos alegados pelo requerente são verdadeiros. Finalmente, afasta-se o argumento do suscitado de que a ata notarial não seria meio hábil para provar a existência e o modo de existir de um fato, como a posse. Isso porque o Art. 384 do Código de Processo Civil prevê expressamente a ata notarial como modo de atestar e documentar algum fato. Tal sentença foi confirmada pelo C. Conselho Superior da Magistratura, em acórdão assim ementado: Registro de Imóveis – Usucapião extrajudicial – Necessidade de instrução do requerimento com ata notarial – Art. 216, inciso I, da Lei nº 6.015/73 e art. 4º, inciso I, do Provimento nº 65, de 14 de dezembro de 2017, da Corregedoria Nacional de Justiça – Alegação de incompatibilidade da exigência formulada com a natureza jurídica e a finalidade da ata notarial – Exigência legal e normativa que não pode ser afastada, em procedimento de natureza administrativa, pelos fundamentos apresentados pelo apelante – Dúvida julgada procedente – Recurso não provido. As razões acima expostas são suficientes para afastar os fundamentos dos suscitados e manter o óbice apresentado pelo Oficial, mantendo assim a exigência quanto a ata notarial. Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 1º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ismael Francisco Mota Siqueira Guarda e outros, mantendo a exigência da ata notarial para seguimento do procedimento de usucapião extrajudicial. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. – ADV: LEONORA ARNOLDI MARTINS FERREIRA (OAB 173286/SP)

Fonte: DJE/SP 10.02.2020

FONTE: Escrito por portaldori

Artigo – Tem Dois Anos e Meio de Vida, porém, a Usucapião Extrajudicial ainda Engatinha – Pedro Teobaldo

A Lei 13.105/2015 (Código de Processo Civil – CPC) promulgada em 2015, entrando em vigor no ano seguinte, trouxe disposto no artigo 1.071 a forma administrativa do reconhecimento da usucapião diretamente no ofício de registro de imóveis, como continuidade do entusiasmo legislativo para desjudicialização.

O texto originário do Código de Processo Civil não estava adequado aos anseios práticos dos operadores do direito e nem da sociedade. Não possibilitava com intensidade o desafogo do judiciário. Existia entrave legal que exigia a anuência expressa dos titulares de direitos reais registrados ou averbados na matrícula do imóvel e considerava o silêncio como discordância.

Motivada pela pressão social e jurídica para uma alteração que adequasse ao disposto no Código Civil, o Poder Executivo editou uma medida provisória posteriormente convertida na graciosa lei nº 13.465/2017, que além de mudar com essa aberração do silêncio como negação, criou outras ferramentas para regularização fundiária.

Passaram-se dois anos e meio da edição da lei facilitadora e o instrumento da usucapião extrajudicial ainda engatinha. Este procedimento precisa vingar, os autores precisam se inteirar, usar e trabalhar na aplicação deste instituto extrajudicial. É um procedimento rico em detalhes, mas não é difícil, pelo contrário, é fácil, célere, seguro e mais barato que o judicial.

A facilidade está na existência de tabeliães e registradores em todos os municípios brasileiros. A celeridade se encontra no procedimento objetivamente elaborado. A segurança está na fé pública das autoridades das serventias extrajudiciais, onde confia-se na aplicação da lei e da normas para aplicação do direito. Quando não protegido pelos benefícios da gratuidade judicial, o processo judicial pode custar muito mais do que o extrajudicial, em razão da extensa demora e dos procedimentos legais necessários.

Os principais atores do procedimento são: advogados, engenheiros ou arquitetos e afins, tabeliães de notas e os registradores de imóveis. Todos têm a função de elaborar e construir o procedimento até culminar em seu reconhecimento ou negativa.

O advogado, antes do tabelião, é o primeiro jurista a ter contato com o caso, por isso, é o primeiro a crer no direito a ser pleiteado. Assim, deve ter o maior zelo e cuidado com processo, expondo minuciosamente todo o espaço da posse percorrido, juntar documentos pertinentes e comprobatórios, observando todas as nuances previstas na legislação, bem como, os provimentos estaduais e o nacional editado pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, o criterioso Provimento nº 65/2017, uma apaziguadora e cuidadosa diretriz criada para orientar todos os envolvidos no procedimento nas serventias extrajudiciais.

O procedimento se inicia extrajudicialmente no cartório de notas (Tabelionato de Notas), lavrando-se a ata notarial de atestação de posse para fins de usucapião. Documento dotado de fé pública, onde o tabelião faz constar sua percepção pessoal de todos os documentos apresentados pelo advogado do requerente fundamentando o direito e a petição deste.

A ata notarial é o documento mais importante para apresentação ao Oficial de Registro de Imóveis e, deve, obrigatoriamente, ser lavrada por tabelião de notas da circunscrição do bem. O tabelião, inclusive, poderá fazer diligências diretamente no imóvel (§ 1º do art. 5 do Provimento 65/2017), para que sua convicção do direito do requerente seja amplamente formada. Pode, ainda, o tabelião, tomar depoimentos de testemunhas, vizinhos, síndico, e de qualquer pessoa importante para afirmar aquilo declarado pelo requerente em seus documentos e formar sua convicção.

Cuidadosamente, o advogado recepcionando o instrumento notarial lavrado e acompanhado dos documentos necessários e importantes para conceder robustez à afirmação do direito de seu cliente, apresentará juntamente com um requerimento (nos moldes de uma petição inicial, conforme art. 389 do CPC); instrumento do mandato, subscrito pelo requerente e seu cônjuge/companheiro, com firma reconhecida; planta do imóvel, se for o caso e os apresentará ao ofício de imóveis competente para protocolo (art. 4 do Provimento 65/2017 do CNJ).

O oficial registrador será o juiz do procedimento, deverá ser o facilitador do processamento, buscar seu pleno convencimento do direito alegado e evitar o excesso de dúvidas registrais.

Com o recebimento do requerimento, junto com os documentos necessários, o registrador o prenotará no livro protocolo, manterá os efeitos da prenotação até o deslinde final do procedimento, seja para declaração da usucapião pleiteada ou para negativa do pedido. Após, autuará os documentos e os analisará em procedimento de qualificação registral preliminar. Nesta fase, identificará se todos os requisitos para aquisição por usucapião foram preenchidos pelo requerente, porém, existindo pendências expedirá nota de devolução elencando-as (art. 198 LRP) para que sejam sanadas pelo apresentante do título.

Se na análise preambular todos os requisitos estiverem cumpridos para espécie de usucapião estabelecida, o oficial encaminhará os documentos pertinentes como notificação às pessoas titulares de direitos registrados e averbados na matrícula do bem e dos imóveis confinantes, bem como, expedirá ciência à União, ao Estado, ao Distrito Federal ou ao Município, entendendo o silêncio dos primeiros como concordância, e dos últimos como ausência de interesse. Contudo, os entes públicos podem impugnar o procedimento até o último momento antes do registro.

Não havendo impugnação, expedirá o oficial edital de notificação aos terceiros eventualmente interessados para manifestação no prazo estabelecido que, em regra, é de quinze dias, mas pode o Oficial ampliar este prazo para garantir aperfeiçoamento (art. 257, III do CPC).

Finalmente, passado o prazo do edital e não havendo o que ser impugnado e estando os documentos em conformidade com a lei, o Oficial Registrador de Imóveis expedirá termo de reconhecimento da usucapião pleiteada pelo requerente e registrará a aquisição do direito.

Todo este procedimento pode ocorrer em menos de seis meses, portanto, inferior a uma gestação normal, garantindo assim que a criança ande mais rápido, no caso, o direito real, seja reconhecido e utilizado o mais rápido possível. Com isso, o imóvel entrará para o mundo jurídico e possibilitará o exercício de todos os direitos inerentes à propriedade ou ao outro direito real declarado aquisição, bem como, possibilitará ao entes fiscais recolherem os tributos competentes, em razão da propriedade, transmissões e sucessões.

Portanto, este instrumento extrajudicial de titulação e de efetivo reconhecimento de direito real deve ser utilizado pelos atores e garantir uma efetiva desjudicialização da regularização fundiária.

Pedro Teobaldo – Advogado.

Fonte: Blog do DG

Posse exclusiva e ininterrupta de co-herdeiro não garante usucapião

SENTENÇA: MARIA DE LOURDES DE SANTANA, propôs a presente AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO em face de ANTÔNIA GERMANIA DE SANTANA e SEVERINO JOSÉ DE SANTANA. A autora alega que reside no imóvel situado na Rua Amália, nº 215, Cordeiro, Recife-PE, desde o ano de 1979, quando se imitiu na posse do mesmo, e lá formou família e criou seus filhos, mantendo desde o início a posse mansa, pacífica, contínua, ininterrupta e sem oposição de terceiros. Tal terreno, no entanto, está registrado em nome dos réus, genitores da autora. Segundo a demandante, desde que ela se imitiu na posse do terreno objeto da ação, juntamente com seu esposo, já falecido, possuiu o animus domini, construiu o imóvel nele existente, realizou as benfeitorias necessárias para a sua manutenção e pagou o imposto predial, a conta de energia e a de água. Diante do acima exposto, ela requereu a declaração em seu favor do domínio do imóvel usucapiendo conforme descrito nas plantas de levantamento da arquitetura e nas informações constantes de seu registro cartorário, a expedição de mandado para que o 4º Cartório de Registro de Imóveis promova o registro da aquisição pleiteada e a averbação da construção descrita na inicial, como “habite-se judicial”. Requereu, também, os benefícios da justiça gratuita. O Juízo deferiu o pedido de gratuidade e determinou a citação dos réus (incertos e não sabidos), dos confinantes e das Fazendas Municipal, Estadual e Federal. Foi publicado edital citando os réus, os confinantes não localizados e eventuais interessados incertos e não sabidos, fls 199-202. As fazendas públicas manifestaram ausência de interesse na demanda, conforme ofícios de fls.138/146/306. Tanto os réus quanto os confinantes foram citados pessoalmente ou por meio de seu representante legal, fls. 92/136. Os réus apresentaram contestação às fls. 96-101, arguindo preliminarmente inepcia da inicial sob o fundamento de que a autora não possui legitimidade para requerê-lo por não preencher os requisitos legais para a aquisição por meio de usucapião nem possuir animus domini. Meritoriamente, eles afirmaram que a autora jamais teve a posse mansa e pacífica do bem objeto da lide. Isso, porque, inicialmente o referido imóvel pertencia à avó materna da autora, que a cedeu em comodato, quando essa última casou, até que ela e seu esposo se organizassem financeiramente para pagar o aluguel. Posteriormente, com a morte da avó da demandante, a propriedade do terreno foi transferido em partilha para a ré, mãe da autora. Durante todo esse período a demandante permaneceu no mencionado terreno, apesar de os réus ressaltarem que o mesmo não lhe pertencia. A autora apresentou réplica, fls. 158-194. Em agosto de 2016, foi informado nos autos o falecimento do réu SEVERINO JOSÉ DE SANTANA, e requerida a habilitação dos seus herdeiros. Tal pedido foi deferido. Foi realizada audiência de instrução e julgamento, em 18/07/2017, com oitiva das partes e testemunhas, fls. 384-396. A autora e os réus apresentaram razões finais, fls.428-470 e 556-561, respectivamente. Vieramme os autos conclusos. É o que importa relatar. Passo a decidir. De início, observo que a preliminar apresentada pelos réus se confunde com o próprio mérito, motivo pelo qual decido a matéria quando enfrentar o mérito da demanda. A usucapião extraordinária, prevista no art. 1.238 do CC/2002, tem como requisitos legais a posse mansa e pacífica do imóvel, com anumus domini, independentemente de justo título e boafé, pelo período de 15 anos. Tal prazo pode ser reduzido para 10 anos, caso o usucapiente resida habitualmente no imóvel ou nele desenvolva atividade produtiva. Conforme acima relatado, a autora afirma que ganhou da sua avó o imóvel objeto da lide, como presente de casamento, e nele habita desde 1979, com anumus domini, sempre de forma mansa, pacífica, ininterrupta e sem oposição de terceiros, motivo pelo qual propôs a presente ação. Analisando os autos, porém, observa-se que inexiste qualquer documentação que comprove a mencionada doação bem como inexistentes testemunhas que tenham presenciado o fato. Assim, não se desobrigou a autora do ônus da prova previsto no art. 373, I do CPC/2015, correspondente ao art. 333 do CPC/1973. Ademais, percebe-se no documento de fls. 129-131, na ação de separação judicial proposta pela autora em face de seu ex-esposo, o reconhecimento, por ela, de que ambos possuiam apenas um bem e que o imóvel situado na Rua Amália, nº 215, Cordeiro, Recife-PE pertencia aos réus. Ou seja, a autora reconheceu nos autos do processo de separação que o bem perseguido não é seu e sim de seus pais, restando, assim demonstrada a inexistência do animus domini. Além disso, apesar de a autora afirmar que era dona do mencionado bem, ela o ocupou, inicialmente, com autorização da sua avó e nele permaneceu com a permissão dos seus pais, aqui réus. A autorização e a permissão concedidas à autora e a sua família para permanecerem no imóvel decorreram de mero ato de tolerância da sua vó e dos seus pais, respectivamente, estes últimos titulares do direito sucessório, inexistindo assim posse, mas sim mera detenção, fato impeditivo da usucapião. Conforme dispõe o art. 1.208 do CC/2002, os atos de mera tolerância, que consistem em permissão tácita para que o outro utilize a coisa por cortesia, não induzem a posse, mas a mera detenção. Sendo este o entendimento jurisprudencial. In verbis: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. COMPOSSE. HERDEIROS. PERMISSÃO DE MORADIA. ANIMUS DOMINI. INEXISTÊNCIA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. MAJORAÇÃO HONORÁRIOS. 1. São condições para aquisição de imóvel por usucapião, seja na modalidade especial, seja na extraordinária, o animus domini daquele que exerce a posse sobre o bem usucapiendo e a ausência de interrupção ou oposição.2. O exercicio da posse como se dono fosse é afastada quando o possuidor está autorizado por meio de negócio juridico ou outro ato de consentimento a ocupar o imóvel, ainda que tenha se empenhado a conservar e aperfeiçoar o bem com desejo de se converter em proprietário. 3. A permissão dos demais herdeiros do bem, compossuidores deste, para a ocupação do imóvel, ainda que por longo tempo, configura ato de mera tolerância, que afasta o animus domini e, consequentemente, impede a usucapião.4. À luz do §11, do art. 85 do NCPC, os honorários devem ser majorados, em face da sucumbência recursal resultante de não provimento do recurso. 5. Recurso conhecido e não provido. (TJDF – 20110112220703 DF 0213032-36.2011.8.07.0001, Relator: Ana Cantarino, Julgado em 09/11/2017, Órgão julgador 8ª Turma Cível, Publicado em 16/11/17).(grifei) Portanto, a mera tolerância dos réus impede a autora de ter a posse do bem, inexistindo assim o preenchimento deste requisito da usucapião. Por fim, após determinado período os réus solicitaram à autora a desocupação e devolução do bem, havendo, desde então, em decorrência disso, desavenças familiares, o que demonstra que quando a autora manifestou a intenção de tomar posse do bem, houve resistência por parte de seus legítimos proprietários, daí não haver a posse mansa e pacífica. Ante os fatos e fundamentos acima expostos, resta demonstrada a inexistência da posse mansa, pacífica, com animus domini e sem oposição de terceiros, motivo pelo qual JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC. Condeno a autora ao pagamento das custas processuais bem como dos honorários advocatícios, que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa acima fixado, com as correções de direito, com fundamento no art. 98, §2º do CPC. A execução das custas e dos honorários, no entanto, ficará sobrestada por cinco anos, até a comprovação de que a beneficiária perdeu a condição de miserabilidade, nos termos do art. 12 da Lei 1.060/1950 c/c art. 98, §3º do CPC. P.R.I. Após o decurso do prazo legal, certifique-se o trânsito em julgado, promovam-se as baixas, e, ao final, arquivem-no. Recife, 12 de novembro de 2019. Julio Cezar Santos da Silva Juiz de Direito Sentença Nº: 2019/00138 Processo Nº: 0042508-22.2014.8.17.0001 Natureza da Ação: Usucapião Autor: MARIA DE LOURDES DE SANTANA Réu: ANTONIA GERMANIA DE SANTANA Réu: SEVERINO JOSE DE SANTANA Advogado: PE008177 – Miraldo José da Silva Réu: Maria José de Santana Réu: Maria Helena de Santana Cavalcante Réu: Maria das Graças Dias de Santana Réu: Maria dos Prazeres da Silva Réu: MUNICIPIO DO RECIFE Réu: SEVERINO JOSÉ SANTANA FILHO Réu: MARIA LINDALVA DE SANTANA GONÇALVES Advogado: PE020519 – ANTONIO CARLOS DA C. L. CAVENDISH MOREIRA

Negativa de assinatura pelo réu não é suficiente para anular perícia grafotécnica

Processo Nº: 0005836-21.2015.8.17.0990
Natureza da Ação: Usucapião
Requerente: Luciano Moraes e Silva
Requerido: JOSÉ TENÓRIO DE ALBUQUERQUE

Despacho: DECISÃO Vistos etc.Trata-se de pedido de realização de nova prova pericial formulado pelo autor Luciano Moraes e Silva à fl. 181. Passo a analisar os argumentos lançados pelo demandante.O peticionário discorda do laudo “uma vez que garante, com plena certeza, não ser sua autoria a assinatura aposta no documento utilizado como comparação (contrato de locação)”. Assevera que chamou sua atenção a ausência do Perito que assinou o laudo (José Moacir Moura de Albuquerque) quando da realização do exame. Diz ainda que, na grafia de seu sobrenome “Moraes”, jamais lançou a letra “M” como está apresentado no documento de comparação e isto deixou de ser observado pelo expert. Ademais, não há “contemporaneidade da assinatura aposta no documento utilizado como comparação (contrato de locação do ano de 2004) com a atual assinatura do Autor”.Quanto ao primeiro argumento do autor, o fato dele continuar negando categoricamente que a assinatura é sua, obviamente, não é motivo suficiente para anular a perícia, que foi realizada exatamente para dirimir a controvérsia instaurada a partir dessa negação do aludido litigante. Ou seja, se fosse para dar absoluta credibilidade à referida alegação do autor, a perícia sequer teria sido deferida.No tocante ao segundo argumento, como se vê no laudo pericial, o perito analisa a “qualidade geral do traçado”, o que envolve calibre, inclinação e demais aspectos descritos à fl. 157 no item V (análise técnica). Logo, a afirmação do autor de que jamais utilizou a letra “M” não tem o condão de invalidar a perícia, pois, como já expus, se fosse para dar total credibilidade às alegações autorais, este juízo prescindiria da prova técnica e resolveria a controvérsia apenas aceitando as colocações do referido litigante quanto à assinatura questionada. Relativamente ao terceiro argumento, não é obrigatório que o perito que colheu as assinaturas seja o mesmo que realizou a análise comparativa, inexiste problema nisso e trata-se de procedimento regular do órgão. No auto de colheita de material para exame grafotécnico às fls. 168 há identificação do perito que acompanhou o ato e no laudo grafoscópico tem-se as conclusões e identificação do perito que fez a análise comparativa, de modo que tudo realizado de forma adequada por peritos no exercício de seu munus. Por fim, o quatro e último argumento do autor atenta contra outra obviedade: não é necessária “contemporaneidade” entre as assinaturas analisadas pelo perito. Não há respaldo técnico científico para esse entendimento do autor e este juízo sequer imagina o que fez o litigante assim supor.Por tais motivos, indefiro o pedido e homologo ao laudo pericial grafoscópico às fls. 156/173. Considero a lide madura para julgamento. Assim, intimem-se as partes para suas alegações finais e dê-se vistas ao MP para sua intervenção final, voltando os autos conclusos, ao final, para sentença.Junte-se cópia do laudo nos autos do processo nº 0010933-02.2015.8.17.0990 para servir de prova emprestada, como já deliberado por este juízo naquele feito, juntando-se ainda a manifestação das partes sobre a perícia e a presente decisão homologatória.Publique-se. Intime-se. Cumpra-se.Olinda, 17/10/2019. Adrianne Maria Ribeiro de Souza Juíza de Direito Juiz de Direito, Raquel Barofaldi Bueno (Auxiliar), Chefe de Secretaria: Danielle Kaline Soares Pires.

Fonte: DJe/PE 13.11.2019

Usufruto é impeditivo para declaração da usucapião extrajudicial

1ª VRP/SP: Registro de Imóveis. Usucapião extrajudicial.

Processo 1104096-79.2019.8.26.010

Dúvida – Registro de Imóveis – Leonor Selva Barbosa – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Leonor Selva Barbosa após negativa de registro de usucapião extrajudicial. A requerente protocolou pedido administrativo de usucapião na modalidade extraordinária tendo por objeto o imóvel matriculado sob o nº 66.181 do 18º Registro de Imóveis da Capital. Alega que era usufrutuária do imóvel, mas que tal condição alterou-se quando celebrou união estável, pois com tal fato o usufruto teria cessado por cláusula resolutiva, sendo que passou a exercer posse como se proprietária fosse, além de preencher os demais requisitos para declaração da prescrição aquisitiva. Regularmente instruído e autuado o procedimento, foram realizadas as notificações previstas em lei e não foi apresentada qualquer impugnação, com exceção da publicação de edital, que não foi publicado pois o Oficial vislumbrou óbice na natureza da posse da requerente, por ser ela usufrutuária do imóvel, usufruto este que tinha por condição resolutiva o casamento da requerente. Como esta não se casou e o usufruto não foi cancelado, continua a ser usufrutuária do imóvel, inexistindo posse justa que fundamente a usucapião (fls, 642/644). A requerente pediu reconsideração da decisão ou remessa dos autos a este juízo (fls. 656/690), aduzindo que não houve impugnação ao pedido, que a ata notarial atestou a posse com animus domini, que a modalidade extraordinária dispensa comprovação de justo título e boa-fé e que houve transmudação do caráter da posse. O Ministério Público opinou às fls. 699/701 pela procedência da dúvida, mantendo a negativa ao registro. É o relatório. Decido. A presente dúvida tem por fundamento o Art. 17, §5º, do Prov. 65/17 do CNJ, que permite a suscitação de dúvida em face de decisão do Oficial de Registro de Imóveis que rejeitar requerimento de usucapião extrajudicial. Nestes termos, cumpre a este juízo analisar se preenche a requerente os requisitos da usucapião, lembrando sempre que o procedimento extrajudicial tem cognição limitada e não impede rediscussão pela via judicial, conforme Art. 216-A, §9º, da Lei de Registros Públicos. Dito isso, esclareço que a mera inexistência de impugnação não leva ao automático reconhecimento do pedido. Tratando-se de meio de aquisição de propriedade (e consequente perda pelo proprietário tabular), cumpre ao Oficial de Registro de Imóveis garantir que estão preenchidos os requisitos legais que autorizam o reconhecimento da prescrição aquisitiva, impedindo o reconhecimento quando o requerente, apesar de não sofrer qualquer oposição, não tem direito a aquisição da propriedade pela via do usucapião. Assim, fica desde logo afastado o argumento da requerente quanto ao silêncio do proprietário tabular, que apesar de fazer presumir sua anuência, não obriga o Oficial a reconhecer pedido inapto por outros fatores. Quanto a ata notarial, em que pese seu inegável valor probatório, a simples afirmação em seu conteúdo de que foram preenchidos os requisitos possessórios não vincula o Oficial de Registro. Isso porque foi a este último que a legislação incumbiu de realizar os trâmites para a declaração de usucapião, com análise de todos os documentos protocolados que, em seu conjunto, incluindo a ata notarial, permitem reconhecer o preenchimento dos requisitos legais. A ata notarial sem dúvida expressa a percepção sensorial do Tabelião quanto aos fatos verificados, não podendo ser desconsiderada principalmente quanto aos fatos relativos a situação contemporânea do imóvel. Assim, se o Tabelião atesta que o requerente ocupa o imóvel, que não há sinais de oposição a posse e que o requerente é conhecido na região pelos vizinhos, tais fatos não podem ser simplesmente afastados pelo registrador, dado sua presunção de veracidade. Todavia, aqueles elementos constantes da ata notarial relativos a fatos passados ou mera descrição de alegações e documentos trazidos pelo próprio requerente são passíveis de reavaliação pelo registrador, principalmente quando confrontados com outros documentos e impugnações trazidos ao processo administrativo que corre perante a serventia imobiliária. No presente caso, a ata notarial de fato comprova que a requerente tem posse atual sobre o imóvel, como se denota da autorização dada a Tabeliã para ingresso no imóvel. Todavia, as alegações referentes a posse passada foram apenas descritas em conformidade com o pedido da requerente, sendo citados os documentos apresentados. Veja-se que não há nenhuma manifestação conclusiva pela Tabeliã acerca da natureza da posse. Na ata consta apenas que “a requerente declara que a posse que exerce desde o início da União Estável é exercida com animus domini, sendo mansa, pacífica, contínua e de boa fé há mais de 15 (quinze) anos, o que caracterizaria os requisitos para a concessão da Usucapião Extraordinária”. Ou seja, a ata faz prova tão somente de que a requerente fez tais declarações, mas não que os fatos declarados são necessariamente verdadeiros, permitindo uma reavaliação pelo Oficial de Registro. Não por outra razão, consta da ata: “A requerente foi ainda cientificada de que esta ata não tem valor de confirmação ou estabelecimento de propriedade, servindo apenas para a instrução de requerimento extrajudicial de usucapião para processamento perante o registro de imóveis competente.” Fica, portanto, afastado o argumento de que a ata notarial comprovaria a posse ad usucapionem da requerente. Quanto a modalidade de usucapião, de fato o Art. 1.238 do Código Civil dispensa a necessidade de boa-fé e justo título para reconhecimento da usucapião extraordinária. Todavia, o requisito do animus domini continua existente, pois o requerente deve “possuir como seu” o imóvel. Ou seja, não basta a mera posse, mas a posse exercida como se proprietário fosse. Por tal razão, superado também o argumento de que a modalidade de usucapião representaria seu reconhecimento com o mero exercício da posse por prazo de 15 anos, já que tal posse deve ser qualificada com o animus de proprietário. Resta, por fim, o argumento relativo a transmudação da propriedade. E, aqui, a posse precária, a título de usufruto, não foi alterada. O R. 3 da matrícula nº 66.181 é claro: a requerente, Leonor Selva Barbosa, em virtude de separação judicial, passou a ter o usufruto do bem, até que “venha a se casar novamente”, hipótese na qual o usufruto seria extinto e o imóvel restituído ao detentor da nua propriedade. Além disso, a requerente foi obrigada a habitar o imóvel com os filhos até que estes atingissem 21 anos. A leitura de tais cláusulas deixa claro que, quando da separação, o usufruto restou atribuído à separanda visando garantir que esta e seus filhos não fossem privados de moradia digna, com “diminuição no seu padrão de vida”, como consta da matrícula. Todavia, fica claro também a natureza passageira de tal usufruto, sendo que a propriedade plena retornaria ao nu proprietário tão logo a usufrutuária se casasse novamente. Ou seja, a requerente tinha ciência de que, casando-se, teria que restituir o imóvel a seu ex-marido, não sendo sua proprietária. Prejudicado, assim, o animus domini necessário ao reconhecimento da usucapião. E nem se diga que, com a união estável, a natureza da posse seria alterada. Isso porque, em que pese a união estável dever ser pública para restar caracterizada, tal publicidade não é ampla em nem gera efeito de presunção de reconhecimento por toda a sociedade. É dizer que não houve prova de que o ex-marido sabia da união e por isso aquiesceu com a utilização da propriedade por ela. A cláusula é clara quanto a necessidade de casamento, e não mera relação com outra pessoa. E o casamento é solenidade pública, com publicação de proclamas e registro com ampla publicidade perante terceiros no registro civil. Assim, até poder-se-ia considerar que, mesmo casando, e não havendo qualquer ato pelo nu proprietário visando reaver a propriedade, a natureza da posse seria alterada, pois este saberia que o usufruto estaria extinto e assim não agiu, já que o casamento de fato gera presunção de ciência por terceiros devido a sua publicidade inerente, advinda do registro e demais formalidades. Com a união estável, contudo, não há tal presunção. Por isso, não há que se dizer que o nu proprietário omitiu-se em reaver a propriedade, já que não houve efetiva existência do fato necessário a realização da cláusula resolutiva, transmudando-se a natureza da propriedade. A requerente não se casou, podendo usufruir do bem, e tenta agora adquirir sua propriedade quando sabidamente não ocupava o bem como proprietária, mas como usufrutuária. Na lição de Benedito Silvério Ribeiro: “A posse, sendo a mera detenção material da coisa, não vai além dessa relação de fato (disposição física), a intenção não ultrapassa a vontade de não abandonar a coisa. É o caso do locatário, do usufrutuário, do comodatário, que detém a coisa em lugar do proprietário” (Tratado de Usucapião, vol. 1, p. 601). Portanto, a requerente não exerce a posse com animus domini pois sabe, e sempre soube, que era usufrutuária do bem, e não sua proprietária. Casando-se, ou com sua morte, o usufruto será extinto, e o bem revertido ao nu proprietário (ou seus herdeiros). Mas a propriedade plena não poderá ser adquirida pela requerente se não por negócio jurídico com o nu proprietário, pois não preenche os requisitos necessários a obtenção da propriedade por usucapião. Lembro, por fim, que tais conclusões são tomadas com os elementos presentes nestes autos, não havendo impedimento para que a requerente busque a via judicial com o fim de produzir outras provas e buscar a alteração do entendimento aqui exarado. Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Leonor Selva Barbosa e mantenho o óbice referente ao pedido extrajudicial de usucapião. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. – ADV: RUBENS GOMES HENRIQUES (OAB 383120/SP)

Fonte: DJE/SP 11.11.2019