Posse exclusiva e ininterrupta de co-herdeiro não garante usucapião

SENTENÇA: MARIA DE LOURDES DE SANTANA, propôs a presente AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO em face de ANTÔNIA GERMANIA DE SANTANA e SEVERINO JOSÉ DE SANTANA. A autora alega que reside no imóvel situado na Rua Amália, nº 215, Cordeiro, Recife-PE, desde o ano de 1979, quando se imitiu na posse do mesmo, e lá formou família e criou seus filhos, mantendo desde o início a posse mansa, pacífica, contínua, ininterrupta e sem oposição de terceiros. Tal terreno, no entanto, está registrado em nome dos réus, genitores da autora. Segundo a demandante, desde que ela se imitiu na posse do terreno objeto da ação, juntamente com seu esposo, já falecido, possuiu o animus domini, construiu o imóvel nele existente, realizou as benfeitorias necessárias para a sua manutenção e pagou o imposto predial, a conta de energia e a de água. Diante do acima exposto, ela requereu a declaração em seu favor do domínio do imóvel usucapiendo conforme descrito nas plantas de levantamento da arquitetura e nas informações constantes de seu registro cartorário, a expedição de mandado para que o 4º Cartório de Registro de Imóveis promova o registro da aquisição pleiteada e a averbação da construção descrita na inicial, como “habite-se judicial”. Requereu, também, os benefícios da justiça gratuita. O Juízo deferiu o pedido de gratuidade e determinou a citação dos réus (incertos e não sabidos), dos confinantes e das Fazendas Municipal, Estadual e Federal. Foi publicado edital citando os réus, os confinantes não localizados e eventuais interessados incertos e não sabidos, fls 199-202. As fazendas públicas manifestaram ausência de interesse na demanda, conforme ofícios de fls.138/146/306. Tanto os réus quanto os confinantes foram citados pessoalmente ou por meio de seu representante legal, fls. 92/136. Os réus apresentaram contestação às fls. 96-101, arguindo preliminarmente inepcia da inicial sob o fundamento de que a autora não possui legitimidade para requerê-lo por não preencher os requisitos legais para a aquisição por meio de usucapião nem possuir animus domini. Meritoriamente, eles afirmaram que a autora jamais teve a posse mansa e pacífica do bem objeto da lide. Isso, porque, inicialmente o referido imóvel pertencia à avó materna da autora, que a cedeu em comodato, quando essa última casou, até que ela e seu esposo se organizassem financeiramente para pagar o aluguel. Posteriormente, com a morte da avó da demandante, a propriedade do terreno foi transferido em partilha para a ré, mãe da autora. Durante todo esse período a demandante permaneceu no mencionado terreno, apesar de os réus ressaltarem que o mesmo não lhe pertencia. A autora apresentou réplica, fls. 158-194. Em agosto de 2016, foi informado nos autos o falecimento do réu SEVERINO JOSÉ DE SANTANA, e requerida a habilitação dos seus herdeiros. Tal pedido foi deferido. Foi realizada audiência de instrução e julgamento, em 18/07/2017, com oitiva das partes e testemunhas, fls. 384-396. A autora e os réus apresentaram razões finais, fls.428-470 e 556-561, respectivamente. Vieramme os autos conclusos. É o que importa relatar. Passo a decidir. De início, observo que a preliminar apresentada pelos réus se confunde com o próprio mérito, motivo pelo qual decido a matéria quando enfrentar o mérito da demanda. A usucapião extraordinária, prevista no art. 1.238 do CC/2002, tem como requisitos legais a posse mansa e pacífica do imóvel, com anumus domini, independentemente de justo título e boafé, pelo período de 15 anos. Tal prazo pode ser reduzido para 10 anos, caso o usucapiente resida habitualmente no imóvel ou nele desenvolva atividade produtiva. Conforme acima relatado, a autora afirma que ganhou da sua avó o imóvel objeto da lide, como presente de casamento, e nele habita desde 1979, com anumus domini, sempre de forma mansa, pacífica, ininterrupta e sem oposição de terceiros, motivo pelo qual propôs a presente ação. Analisando os autos, porém, observa-se que inexiste qualquer documentação que comprove a mencionada doação bem como inexistentes testemunhas que tenham presenciado o fato. Assim, não se desobrigou a autora do ônus da prova previsto no art. 373, I do CPC/2015, correspondente ao art. 333 do CPC/1973. Ademais, percebe-se no documento de fls. 129-131, na ação de separação judicial proposta pela autora em face de seu ex-esposo, o reconhecimento, por ela, de que ambos possuiam apenas um bem e que o imóvel situado na Rua Amália, nº 215, Cordeiro, Recife-PE pertencia aos réus. Ou seja, a autora reconheceu nos autos do processo de separação que o bem perseguido não é seu e sim de seus pais, restando, assim demonstrada a inexistência do animus domini. Além disso, apesar de a autora afirmar que era dona do mencionado bem, ela o ocupou, inicialmente, com autorização da sua avó e nele permaneceu com a permissão dos seus pais, aqui réus. A autorização e a permissão concedidas à autora e a sua família para permanecerem no imóvel decorreram de mero ato de tolerância da sua vó e dos seus pais, respectivamente, estes últimos titulares do direito sucessório, inexistindo assim posse, mas sim mera detenção, fato impeditivo da usucapião. Conforme dispõe o art. 1.208 do CC/2002, os atos de mera tolerância, que consistem em permissão tácita para que o outro utilize a coisa por cortesia, não induzem a posse, mas a mera detenção. Sendo este o entendimento jurisprudencial. In verbis: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. COMPOSSE. HERDEIROS. PERMISSÃO DE MORADIA. ANIMUS DOMINI. INEXISTÊNCIA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. MAJORAÇÃO HONORÁRIOS. 1. São condições para aquisição de imóvel por usucapião, seja na modalidade especial, seja na extraordinária, o animus domini daquele que exerce a posse sobre o bem usucapiendo e a ausência de interrupção ou oposição.2. O exercicio da posse como se dono fosse é afastada quando o possuidor está autorizado por meio de negócio juridico ou outro ato de consentimento a ocupar o imóvel, ainda que tenha se empenhado a conservar e aperfeiçoar o bem com desejo de se converter em proprietário. 3. A permissão dos demais herdeiros do bem, compossuidores deste, para a ocupação do imóvel, ainda que por longo tempo, configura ato de mera tolerância, que afasta o animus domini e, consequentemente, impede a usucapião.4. À luz do §11, do art. 85 do NCPC, os honorários devem ser majorados, em face da sucumbência recursal resultante de não provimento do recurso. 5. Recurso conhecido e não provido. (TJDF – 20110112220703 DF 0213032-36.2011.8.07.0001, Relator: Ana Cantarino, Julgado em 09/11/2017, Órgão julgador 8ª Turma Cível, Publicado em 16/11/17).(grifei) Portanto, a mera tolerância dos réus impede a autora de ter a posse do bem, inexistindo assim o preenchimento deste requisito da usucapião. Por fim, após determinado período os réus solicitaram à autora a desocupação e devolução do bem, havendo, desde então, em decorrência disso, desavenças familiares, o que demonstra que quando a autora manifestou a intenção de tomar posse do bem, houve resistência por parte de seus legítimos proprietários, daí não haver a posse mansa e pacífica. Ante os fatos e fundamentos acima expostos, resta demonstrada a inexistência da posse mansa, pacífica, com animus domini e sem oposição de terceiros, motivo pelo qual JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC. Condeno a autora ao pagamento das custas processuais bem como dos honorários advocatícios, que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa acima fixado, com as correções de direito, com fundamento no art. 98, §2º do CPC. A execução das custas e dos honorários, no entanto, ficará sobrestada por cinco anos, até a comprovação de que a beneficiária perdeu a condição de miserabilidade, nos termos do art. 12 da Lei 1.060/1950 c/c art. 98, §3º do CPC. P.R.I. Após o decurso do prazo legal, certifique-se o trânsito em julgado, promovam-se as baixas, e, ao final, arquivem-no. Recife, 12 de novembro de 2019. Julio Cezar Santos da Silva Juiz de Direito Sentença Nº: 2019/00138 Processo Nº: 0042508-22.2014.8.17.0001 Natureza da Ação: Usucapião Autor: MARIA DE LOURDES DE SANTANA Réu: ANTONIA GERMANIA DE SANTANA Réu: SEVERINO JOSE DE SANTANA Advogado: PE008177 – Miraldo José da Silva Réu: Maria José de Santana Réu: Maria Helena de Santana Cavalcante Réu: Maria das Graças Dias de Santana Réu: Maria dos Prazeres da Silva Réu: MUNICIPIO DO RECIFE Réu: SEVERINO JOSÉ SANTANA FILHO Réu: MARIA LINDALVA DE SANTANA GONÇALVES Advogado: PE020519 – ANTONIO CARLOS DA C. L. CAVENDISH MOREIRA

Negativa de assinatura pelo réu não é suficiente para anular perícia grafotécnica

Processo Nº: 0005836-21.2015.8.17.0990
Natureza da Ação: Usucapião
Requerente: Luciano Moraes e Silva
Requerido: JOSÉ TENÓRIO DE ALBUQUERQUE

Despacho: DECISÃO Vistos etc.Trata-se de pedido de realização de nova prova pericial formulado pelo autor Luciano Moraes e Silva à fl. 181. Passo a analisar os argumentos lançados pelo demandante.O peticionário discorda do laudo “uma vez que garante, com plena certeza, não ser sua autoria a assinatura aposta no documento utilizado como comparação (contrato de locação)”. Assevera que chamou sua atenção a ausência do Perito que assinou o laudo (José Moacir Moura de Albuquerque) quando da realização do exame. Diz ainda que, na grafia de seu sobrenome “Moraes”, jamais lançou a letra “M” como está apresentado no documento de comparação e isto deixou de ser observado pelo expert. Ademais, não há “contemporaneidade da assinatura aposta no documento utilizado como comparação (contrato de locação do ano de 2004) com a atual assinatura do Autor”.Quanto ao primeiro argumento do autor, o fato dele continuar negando categoricamente que a assinatura é sua, obviamente, não é motivo suficiente para anular a perícia, que foi realizada exatamente para dirimir a controvérsia instaurada a partir dessa negação do aludido litigante. Ou seja, se fosse para dar absoluta credibilidade à referida alegação do autor, a perícia sequer teria sido deferida.No tocante ao segundo argumento, como se vê no laudo pericial, o perito analisa a “qualidade geral do traçado”, o que envolve calibre, inclinação e demais aspectos descritos à fl. 157 no item V (análise técnica). Logo, a afirmação do autor de que jamais utilizou a letra “M” não tem o condão de invalidar a perícia, pois, como já expus, se fosse para dar total credibilidade às alegações autorais, este juízo prescindiria da prova técnica e resolveria a controvérsia apenas aceitando as colocações do referido litigante quanto à assinatura questionada. Relativamente ao terceiro argumento, não é obrigatório que o perito que colheu as assinaturas seja o mesmo que realizou a análise comparativa, inexiste problema nisso e trata-se de procedimento regular do órgão. No auto de colheita de material para exame grafotécnico às fls. 168 há identificação do perito que acompanhou o ato e no laudo grafoscópico tem-se as conclusões e identificação do perito que fez a análise comparativa, de modo que tudo realizado de forma adequada por peritos no exercício de seu munus. Por fim, o quatro e último argumento do autor atenta contra outra obviedade: não é necessária “contemporaneidade” entre as assinaturas analisadas pelo perito. Não há respaldo técnico científico para esse entendimento do autor e este juízo sequer imagina o que fez o litigante assim supor.Por tais motivos, indefiro o pedido e homologo ao laudo pericial grafoscópico às fls. 156/173. Considero a lide madura para julgamento. Assim, intimem-se as partes para suas alegações finais e dê-se vistas ao MP para sua intervenção final, voltando os autos conclusos, ao final, para sentença.Junte-se cópia do laudo nos autos do processo nº 0010933-02.2015.8.17.0990 para servir de prova emprestada, como já deliberado por este juízo naquele feito, juntando-se ainda a manifestação das partes sobre a perícia e a presente decisão homologatória.Publique-se. Intime-se. Cumpra-se.Olinda, 17/10/2019. Adrianne Maria Ribeiro de Souza Juíza de Direito Juiz de Direito, Raquel Barofaldi Bueno (Auxiliar), Chefe de Secretaria: Danielle Kaline Soares Pires.

Fonte: DJe/PE 13.11.2019

Usufruto é impeditivo para declaração da usucapião extrajudicial

1ª VRP/SP: Registro de Imóveis. Usucapião extrajudicial.

Processo 1104096-79.2019.8.26.010

Dúvida – Registro de Imóveis – Leonor Selva Barbosa – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Leonor Selva Barbosa após negativa de registro de usucapião extrajudicial. A requerente protocolou pedido administrativo de usucapião na modalidade extraordinária tendo por objeto o imóvel matriculado sob o nº 66.181 do 18º Registro de Imóveis da Capital. Alega que era usufrutuária do imóvel, mas que tal condição alterou-se quando celebrou união estável, pois com tal fato o usufruto teria cessado por cláusula resolutiva, sendo que passou a exercer posse como se proprietária fosse, além de preencher os demais requisitos para declaração da prescrição aquisitiva. Regularmente instruído e autuado o procedimento, foram realizadas as notificações previstas em lei e não foi apresentada qualquer impugnação, com exceção da publicação de edital, que não foi publicado pois o Oficial vislumbrou óbice na natureza da posse da requerente, por ser ela usufrutuária do imóvel, usufruto este que tinha por condição resolutiva o casamento da requerente. Como esta não se casou e o usufruto não foi cancelado, continua a ser usufrutuária do imóvel, inexistindo posse justa que fundamente a usucapião (fls, 642/644). A requerente pediu reconsideração da decisão ou remessa dos autos a este juízo (fls. 656/690), aduzindo que não houve impugnação ao pedido, que a ata notarial atestou a posse com animus domini, que a modalidade extraordinária dispensa comprovação de justo título e boa-fé e que houve transmudação do caráter da posse. O Ministério Público opinou às fls. 699/701 pela procedência da dúvida, mantendo a negativa ao registro. É o relatório. Decido. A presente dúvida tem por fundamento o Art. 17, §5º, do Prov. 65/17 do CNJ, que permite a suscitação de dúvida em face de decisão do Oficial de Registro de Imóveis que rejeitar requerimento de usucapião extrajudicial. Nestes termos, cumpre a este juízo analisar se preenche a requerente os requisitos da usucapião, lembrando sempre que o procedimento extrajudicial tem cognição limitada e não impede rediscussão pela via judicial, conforme Art. 216-A, §9º, da Lei de Registros Públicos. Dito isso, esclareço que a mera inexistência de impugnação não leva ao automático reconhecimento do pedido. Tratando-se de meio de aquisição de propriedade (e consequente perda pelo proprietário tabular), cumpre ao Oficial de Registro de Imóveis garantir que estão preenchidos os requisitos legais que autorizam o reconhecimento da prescrição aquisitiva, impedindo o reconhecimento quando o requerente, apesar de não sofrer qualquer oposição, não tem direito a aquisição da propriedade pela via do usucapião. Assim, fica desde logo afastado o argumento da requerente quanto ao silêncio do proprietário tabular, que apesar de fazer presumir sua anuência, não obriga o Oficial a reconhecer pedido inapto por outros fatores. Quanto a ata notarial, em que pese seu inegável valor probatório, a simples afirmação em seu conteúdo de que foram preenchidos os requisitos possessórios não vincula o Oficial de Registro. Isso porque foi a este último que a legislação incumbiu de realizar os trâmites para a declaração de usucapião, com análise de todos os documentos protocolados que, em seu conjunto, incluindo a ata notarial, permitem reconhecer o preenchimento dos requisitos legais. A ata notarial sem dúvida expressa a percepção sensorial do Tabelião quanto aos fatos verificados, não podendo ser desconsiderada principalmente quanto aos fatos relativos a situação contemporânea do imóvel. Assim, se o Tabelião atesta que o requerente ocupa o imóvel, que não há sinais de oposição a posse e que o requerente é conhecido na região pelos vizinhos, tais fatos não podem ser simplesmente afastados pelo registrador, dado sua presunção de veracidade. Todavia, aqueles elementos constantes da ata notarial relativos a fatos passados ou mera descrição de alegações e documentos trazidos pelo próprio requerente são passíveis de reavaliação pelo registrador, principalmente quando confrontados com outros documentos e impugnações trazidos ao processo administrativo que corre perante a serventia imobiliária. No presente caso, a ata notarial de fato comprova que a requerente tem posse atual sobre o imóvel, como se denota da autorização dada a Tabeliã para ingresso no imóvel. Todavia, as alegações referentes a posse passada foram apenas descritas em conformidade com o pedido da requerente, sendo citados os documentos apresentados. Veja-se que não há nenhuma manifestação conclusiva pela Tabeliã acerca da natureza da posse. Na ata consta apenas que “a requerente declara que a posse que exerce desde o início da União Estável é exercida com animus domini, sendo mansa, pacífica, contínua e de boa fé há mais de 15 (quinze) anos, o que caracterizaria os requisitos para a concessão da Usucapião Extraordinária”. Ou seja, a ata faz prova tão somente de que a requerente fez tais declarações, mas não que os fatos declarados são necessariamente verdadeiros, permitindo uma reavaliação pelo Oficial de Registro. Não por outra razão, consta da ata: “A requerente foi ainda cientificada de que esta ata não tem valor de confirmação ou estabelecimento de propriedade, servindo apenas para a instrução de requerimento extrajudicial de usucapião para processamento perante o registro de imóveis competente.” Fica, portanto, afastado o argumento de que a ata notarial comprovaria a posse ad usucapionem da requerente. Quanto a modalidade de usucapião, de fato o Art. 1.238 do Código Civil dispensa a necessidade de boa-fé e justo título para reconhecimento da usucapião extraordinária. Todavia, o requisito do animus domini continua existente, pois o requerente deve “possuir como seu” o imóvel. Ou seja, não basta a mera posse, mas a posse exercida como se proprietário fosse. Por tal razão, superado também o argumento de que a modalidade de usucapião representaria seu reconhecimento com o mero exercício da posse por prazo de 15 anos, já que tal posse deve ser qualificada com o animus de proprietário. Resta, por fim, o argumento relativo a transmudação da propriedade. E, aqui, a posse precária, a título de usufruto, não foi alterada. O R. 3 da matrícula nº 66.181 é claro: a requerente, Leonor Selva Barbosa, em virtude de separação judicial, passou a ter o usufruto do bem, até que “venha a se casar novamente”, hipótese na qual o usufruto seria extinto e o imóvel restituído ao detentor da nua propriedade. Além disso, a requerente foi obrigada a habitar o imóvel com os filhos até que estes atingissem 21 anos. A leitura de tais cláusulas deixa claro que, quando da separação, o usufruto restou atribuído à separanda visando garantir que esta e seus filhos não fossem privados de moradia digna, com “diminuição no seu padrão de vida”, como consta da matrícula. Todavia, fica claro também a natureza passageira de tal usufruto, sendo que a propriedade plena retornaria ao nu proprietário tão logo a usufrutuária se casasse novamente. Ou seja, a requerente tinha ciência de que, casando-se, teria que restituir o imóvel a seu ex-marido, não sendo sua proprietária. Prejudicado, assim, o animus domini necessário ao reconhecimento da usucapião. E nem se diga que, com a união estável, a natureza da posse seria alterada. Isso porque, em que pese a união estável dever ser pública para restar caracterizada, tal publicidade não é ampla em nem gera efeito de presunção de reconhecimento por toda a sociedade. É dizer que não houve prova de que o ex-marido sabia da união e por isso aquiesceu com a utilização da propriedade por ela. A cláusula é clara quanto a necessidade de casamento, e não mera relação com outra pessoa. E o casamento é solenidade pública, com publicação de proclamas e registro com ampla publicidade perante terceiros no registro civil. Assim, até poder-se-ia considerar que, mesmo casando, e não havendo qualquer ato pelo nu proprietário visando reaver a propriedade, a natureza da posse seria alterada, pois este saberia que o usufruto estaria extinto e assim não agiu, já que o casamento de fato gera presunção de ciência por terceiros devido a sua publicidade inerente, advinda do registro e demais formalidades. Com a união estável, contudo, não há tal presunção. Por isso, não há que se dizer que o nu proprietário omitiu-se em reaver a propriedade, já que não houve efetiva existência do fato necessário a realização da cláusula resolutiva, transmudando-se a natureza da propriedade. A requerente não se casou, podendo usufruir do bem, e tenta agora adquirir sua propriedade quando sabidamente não ocupava o bem como proprietária, mas como usufrutuária. Na lição de Benedito Silvério Ribeiro: “A posse, sendo a mera detenção material da coisa, não vai além dessa relação de fato (disposição física), a intenção não ultrapassa a vontade de não abandonar a coisa. É o caso do locatário, do usufrutuário, do comodatário, que detém a coisa em lugar do proprietário” (Tratado de Usucapião, vol. 1, p. 601). Portanto, a requerente não exerce a posse com animus domini pois sabe, e sempre soube, que era usufrutuária do bem, e não sua proprietária. Casando-se, ou com sua morte, o usufruto será extinto, e o bem revertido ao nu proprietário (ou seus herdeiros). Mas a propriedade plena não poderá ser adquirida pela requerente se não por negócio jurídico com o nu proprietário, pois não preenche os requisitos necessários a obtenção da propriedade por usucapião. Lembro, por fim, que tais conclusões são tomadas com os elementos presentes nestes autos, não havendo impedimento para que a requerente busque a via judicial com o fim de produzir outras provas e buscar a alteração do entendimento aqui exarado. Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Leonor Selva Barbosa e mantenho o óbice referente ao pedido extrajudicial de usucapião. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. – ADV: RUBENS GOMES HENRIQUES (OAB 383120/SP)

Fonte: DJE/SP 11.11.2019

Registro de Imóveis. Lei n. 9.514/97. Intimação por edital após infrutíferas notificações é procedimento correto. 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo

Processo 0052875-45.2017.8.26.0100

Pedido de Providências

Reqte.: Corregedoria Geral da Justiça

Interesdos.: 3º Registro de Imóveis da Capital – 2ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo Foro João Mendes – Marcio Pereira da Silva – Sentença (fls. 393/395): Vistos. Trata-se de pedido de providências encaminhado a este Juízo pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, comunicando a formulação de ação anulatória cumulada com indenização por danos morais movida em face do Banco Santander e do Oficial do 3º Registro de Imóveis da Capital, perante o MMº Juízo da 2ª Vara Cível da Capital (processo nº 1062071-22.2017.8.26.000). Juntou documentos às fls.02/64. O registrador manifestou-se às fls.66/70. Esclarece que o ação foi ajuizada por Márcio Pereira da Silva, requerendo a anulação da consolidação da propriedade do imóvel, objeto da matrícula nº 87.484, em nome do credor fiduciário, sob o argumento de que não foi regularmente intimado, nos termos do art.26 da Lei nº 9.514/97. Informa que, ao contrário do que faz crer o requerente, agiu em estrita observância da lei (art.26 da Lei nº 9.514/97) e das Normas Extrajudiciais da Corregedoria Geral da Justiça (Cap. XX, itens 249 e 250), tendo utilizado os três meios de intimação autorizados, totalizando 14 tentativas infrutíferas para notificação, razão pela qual efetuou a intimação por edital do devedor, nos termos do Cap. XX, item 253 das Normas de Serviços da Corregedoria Geral da Justiça. Afirma que, após o decurso do prazo sem pagamento, procedeu a sua certificação e notificou o Banco Santander S/A para que solicitasse a consolidação da propriedade em seu nome e recolhesse o imposto devido, o que foi cumprido pela instituição financeira. Apresentou documentos às fls.71/292. A fim de evitar decisões conflitantes, tendo em vista que o feito envolvendo a anulação da consolidação da propriedade encontrava-se em tramite perante o MMº Juízo Cível, foi determinada a suspensão deste procedimento até o deslinde daquele feito, o qual foi julgado improcedente, sob a fundamentação de que o banco e o Oficial obedeceram todo o procedimento previsto na legislação atá a consolidação da propriedade do imóvel em nome da instituição financeira, sendo a decisão confirmada pelo Egrégio Tribunal de Justiça (fls.376/379 e 386/387). O Ministério Público opinou pelo arquivamento, ante a ausência de qualquer conduta irregular praticada pelo Registrador (fls.391/392). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Conforme o v. Acórdão de fls.376/379, proferido pela Egrégia 28ª Câmara de Direito Privado, a notificação de mora e posterior consolidação deu-se conforme previsto pelo artigo 26, § 7º, da Lei 9.514/97. Confira-se: “… É incontroverso que houve tentativa de notificação pessoal do apelante, realizada pelo oficial do registro de imóveis, tal como prevê o art.26, § 1º da Lei nº 9.514/97. Não localizado em três tentativas, seguiu-se à intimação por edital, nos termos do art.26, § 4º, da Lei nº 9.514/97. … Nesse contexto, não há que se falar em irregularidade no procedimento extrajudicial adotado pelos apelados, como bem ressaltou a decisão recorrida, que conferiu adequada solução à lide”. De fato, os documentos juntados pelo registrador às fls.77/292 demonstram que houve estrita observância às normas legais, sendo certo que ocorreram 14 tentativas frustradas de intimação do devedor para purgação da mora, resultando na intimação por edital nos termos do art.26, § 4º, da Lei nº 9.514/97 e Cap. XX, item 253 das Normas de Serviços da Corregedoria Geral da Justiça. Concluo, portanto, que não houve qualquer conduta irregular ou falta funcional do delegatário passível da aplicação de medida disciplinar, razão pela qual determino o arquivamento do presente processo. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Sem prejuízo, oficie-se à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, comunicando desta decisão. P.R.I.C. São Paulo, 1 de novembro de 2019. Tania Mara Ahualli Juiza de Direito (CP 406)

Fonte: DJE/SP 07/11/2019

CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ nº 43 – 2019

CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ nº 43, de 30.10.2019 – D.J.E.: 30.10.2019

Ementa: Dispõe sobre o procedimento prévio a ser observado por todos os registradores civis do País para a lavratura de registros de nascimento e passaportes.

O CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA, usando de suas atribuições constitucionais, legais e regimentais e

CONSIDERANDO o poder de fiscalização e de normatização do Poder Judiciário dos atos praticados por seus órgãos (art. 103-B, § 4º, I, II e III, da Constituição Federal);

CONSIDERANDO a competência do Poder Judiciário de fiscalizar os serviços notariais e de registro (arts. 103-B, § 4º, I e III, e 236, § 1º, da Constituição Federal);

CONSIDERANDO a competência do Corregedor Nacional de Justiça de expedir recomendações e outros atos normativos destinados ao aperfeiçoamento das atividades dos serviços notariais e de registro (art. 8º, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça);

CONSIDERANDO a obrigação dos notários e registradores de cumprir as normas técnicas estabelecidas pelo Poder Judiciário (arts. 37 e 38 da Lei n. 8.935, de 18 de novembro de 1994);

CONSIDERANDO as normas do Provimento n. 46, de 16/6/2015, da Corregedoria Nacional de Justiça, que dispõe sobre a Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais – CRC;

CONSIDERANDO o avanço tecnológico, a informatização e a implementação de sistemas eletrônicos compartilhados e de sistema de registro eletrônico que possibilitam a realização das atividades de registro mediante o uso de tecnologias da informação e comunicação;

CONSIDERANDO a possiblidade da ocorrência de fraudes na lavratura de registro de nascimento com fundamento na mesma Declaração de Nascido Vivo-DNV;

CONSIDERANDO a necessidade de estabelecer um protocolo prévio de verificação das Declarações de Nascido Vivo – DNV por todos os registradores civis do País, antes da lavratura dos registros de nascimento, a fim de garantir maior segurança jurídica na prática do ato;

CONSIDERANDO o decidido no Pedido de Providências n. 0008479-45.2019.2.00.0000,

RESOLVE:

Art. 1º RECOMENDAR aos Ofícios de Registro Civil de Pessoas Naturais de todo o território nacional que, antes da lavratura de qualquer registro de nascimento, seja realizada consulta prévia à Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais – CRC, a fim de verificar a existência de registro de nascimento lavrado com o mesmo número de Declaração de Nascido Vivo-DNV.

Parágrafo único. Havendo registro de nascimento anteriormente lavrado com o mesmo número da Declaração de Nascido Vivo-DNV apresentado, o Oficial de Registro Civil, titular, interino ou interventor, não lavrará o registro de nascimento, encaminhando cópias dos documentos apresentados pelo interessado e sua identificação às autoridades policiais e ao Ministério Público no prazo de 48 (quarenta e oito) horas.

Art. 2º Os Ofícios deRegistro Civil de Pessoas Naturais que emitirem documentos de identificação dos cidadãos, mediante convênio, credenciamento e matrícula com órgãos e entidades governamentais privadas, na forma do Provimento n. 66, de 25 de janeiro de 2018, deverão, antes da emissão de passaportes, efetuar consulta à Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais – CRC, a fim de verificar a regularidade do registro de nascimento e respectiva Declaração de Nascido Vivo – DNV.

Parágrafo único. Sendo constatada a utilização da mesma Declaração de Nascido Vivo – DNV para a lavratura de mais de um registro de nascimento, deve o Oficial de Registro Civil, titular, interino ou interventor agir na forma do parágrafo único do artigo anterior.

Art. 3º As Corregedorias dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal devem fiscalizar o cumprimento desta Recomendação, instaurando procedimentos administrativos em desfavor dos registradores que deixarem de observar as regras aqui estabelecidas, sem prejuízo da comunicação e envio dos documentos às autoridades policiais e ao Ministério Público.

Art. 4º Esta recomendação entra em vigor na data de sua publicação.

Ministro HUMBERTO MARTINS

Corregedor Nacional de Justiça

Provimento do TJPE dispensa as certidões negativas nos serviços extrajudiciais

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE PERNAMBUCO
CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Gabinete do Corregedor Geral da Justiça

PROVIMENTO Nº 16 /2019

ACRESCENTA ao art. 1.074, o Parágrafo único; ao artigo 1.004, o § 6º; ALTERA a redação os artigos 302 caput e seu § 1º; 817; 1.070 caput e seu § 1º; 1.134; 1.140, § 2º; 1.196; 1.319 § § 1º e 2º; e 1.330 caput ; REVOGA os artigos 298, inc. IX; 1.074, VI, §§ 1º, 2º, 3º; 1.115, Parágrafo único; 1.235, inc. VII; e incisos I e II do art. 1.330, todos do Código de Normas dos Serviços Notariais e Registrais do Estado de Pernambuco, que dispõem sobre as exigências relativas às Certidões Negativas de Débitos – CND referentes a créditos tributários, de contribuições federais e de outras imposições pecuniárias para ingresso de qualquer operação financeira no registro de imóveis, por representar forma oblíqua de cobrança do Estado e por ter sido retirada do ordenamento jurídico a norma que impõe a comprovação da quitação de qualquer tipo de débito tributário, vez que foi reconhecida a inconstitucionalidade do artigo 1°, inciso IV da lei n°

O CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO , Desembargador FERNANDO CERQUEIRA NORBERTO DOS SANTOS, no uso das suas atribuições legais e regimentais, e;

CONSIDERANDO a obrigação de constante aprimoramento e revisão do Código de Normas dos Serviços Notariais e Registrais do Estado de Pernambuco;

CONSIDERANDO o julgamento paradigma, no âmbito do Supremo Tribunal Federal – STF, consubstanciado na ADI n°394, na qual declarou a inconstitucionalidade do art. 1°, IV da Lei n° 7.711/88, de maneira que, excluiu a exigência de Certidões Negativas de Débitos Tributários – CND para o ingresso de qualquer operação financeira no registro de imóveis;

CONSIDERANDO que o CNJ, seguindo a orientação do STF, no pedido de providencia n. 0001230-82.2015.2.00.0000, por votação unânime, decidiu que não há mais que se falar em comprovação da quitação de créditos tributários, de contribuições federais e de outras imposições pecuniárias compulsórias para o ingresso de qualquer operação financeira no registro de imóveis, por representar forma oblíqua de cobrança do Estado, subtraindo do contribuinte os direitos fundamentais de livre acesso ao Poder Judiciário e ao devido processo legal (art. 5º, XXXV e LIV, da CF).

RESOLVE:

Art. 1º. ACRESCE ao art. 1.074, o Parágrafo único, e ao artigo 1.004, o § 6º: “Art. 1.074 (…)
Parágrafo único. Na promessa de compra e venda celebrada por instrumento público, devem ser observados, no que couber, os mesmos requisitos exigidos para a escritura ou contrato de compra de venda”.

“Art. 1.004 (…)

  • 6º. Ressalvadas as hipóteses em que o próprio ato a ser praticado constitui fato gerador de tributo, como ocorre nas transmissões de propriedade, as exigências de comprovação da quitação de outros créditos tributários federais, estaduais, ou municipais não impedirão o ingresso de qualquer título no registro de imóveis, por serem inconstitucionais os meios de cobrança indireta de tributos, conforme precedentes do Conselho Nacional de Justiça no Pedido de Providências n° 0001230-82.2018.2.00.0000, e a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 394/DF”.

Art. 2º. Em razão do disposto no artigo Parágrafo único do artigo 1.074, ficam ALTERADOS os seguintes dispositivos do Código de Normas dos Serviços Notariais e Registrais do Estado de Pernambuco: artigos 302 caput e seu § 1º; 817; 1.070 caput e seu § 1º; 1.134; 1.140, § 2º; 1.196; 1.319 § § 1º e 2º; e 1.330 caput:

“Art. 302. Na alienação de imóvel por pessoa física ou jurídica, esta de direito público ou privado, ficam dispensados os Tabeliães de Notas de exigir a exibição da Certidão Negativa ou Positiva com efeitos de Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CND) emitida pela Receita Federal do Brasil. (Alterado em razão do julgamento da ADI 394 pelo STF e da decisão proferida pelo CNJ no Pedido de Providências n° 0001230-82.2018.2.00.0000).

  • 1°. Caso a CND seja apresentada voluntariamente pela pessoa física ou jurídica, no seu prazo de validade, tendo em vista a inexigibilidade prevista no artigo 302, a Certidão Negativa de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CND), deverá ser confirmada pelo tabelião, observando-se o seguinte:”

“Art. 817. Não será exigida a apresentação da Certidão Negativa de Débito (CND) do INSS, da Pessoa física ou Jurídica para o registro de contratos de alienação ou oneração de bens imóveis, ainda que estejam incorporados ao ativo permanente em sua contabilidade. (Alterado em razão do julgamento da ADI 394 pelo STF e da decisão proferida pelo CNJ no Pedido de Providências n° 0001230-82.2018.2.00.0000)”.

“Art. 1.070. Sendo o vendedor pessoa física ou jurídica, esta de direito público ou privado, não será necessário apresentar:

  • 1° Caso uma das certidões acima mencionadas sejam apresentadas voluntariamente ante sua inexigibilidade, a escritura ou contrato deverá consignar, com relação a cada uma dessas certidões emitidas através da Internet, a sua denominação, se certidão negativa ou certidão positiva com efeitos de negativa, o seu código respectivo, data de emissão e data de validade. (Alterado em razão do julgamento da ADI 394 pelo STF e da decisão proferida pelo CNJ no Pedido de Providências n° 0001230-82.2018.2.00.0000)”.

“Art. 1.134. Se o proprietário do imóvel objeto do direito de superfície for pessoa física ou jurídica, fica dispensada a consignação, na escritura de constituição, da Certidão Negativa de Débito (CND) da previdência Social e a Certidão conjunta emitida pela Receita Federal do Brasil e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), relativa a tributos federais e Dívida Ativa da união. (Alterado em razão do julgamento da ADI 394 pelo STF e da decisão proferida pelo CNJ no Pedido de Providências n° 0001230-82.2018.2.00.0000)”.

“Art. 1.140 (…)

  • 2°. Se o proprietário do imóvel serviente for pessoa física ou jurídica, esta de direito público ou privado, fica dispensada a consignação, na escritura de constituição, da Certidão Negativa de Débito (CND) da previdência Social e a Certidão conjunta, emitida pela Receita Federal do Brasil e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), relativa a tributos federais e Dívida Ativa da união. (Alterado em razão do julgamento da ADI 394 pelo STF e da decisão proferida pelo CNJ no Pedido de Providências n° 0001230-82.2018.2.00.0000)”.

“Art. 1.196. A Certidão Negativa de Débito – CND da previdência Social não é documento obrigatório, para averbação das obras citadas no artigo anterior, tanto para prédios situados na zona urbana como na zona rural, mas caso seja apresentada voluntariamente, o registrador fará constar os seus dados no respectivo ato de averbação da construção, tudo em conformidade com os precedentes do Conselho Nacional de Justiça no Pedido de Providências n° 0001230-82.2018.2.00.0000, e decisão proferida no Supremo Tribunal Federal na ADI 394/DF”.

“Art. 1.319(…)

  • 1º É dispensado o habite-se expedido pela prefeitura municipal para a averbação de construção residencial urbana unifamiliar de um só pavimento finalizada há mais de 5 (cinco) anos em área ocupada predominantemente por população de baixa renda, inclusive para o fim de registro ou averbação decorrente de financiamento à moradia. (Redação dada ao art. 247-A da Lei 6.015/73 pela Lei 13.865/2019)
  • 2º Não será exigida a apresentação da Certidão Negativa de Débito – CND da previdência Social para a averbação da construção, nos termos do art. 1.196 deste Código de Normas”.

“Art. 1.330. O registrador não exigirá a comprovação do pagamento do ITR/IPTU ou a CND do INSS em nome da pessoa física ou jurídica, esta de direito público ou privado, proprietária de imóvel no registro da carta de arrematação ou carta de adjudicação”.

Art. 3º. Ainda em razão das alterações, ficam REVOGADOS os artigos 298, inc. IX; 1.074, VI, §§ 1º, 2º, 3º; 1.115, Parágrafo único; 1.235, inc. VII; e incisos I e II do art. 1.330

“Art. 298(…)

IX (REVOGADO)”

“Art. 1.074 (…)
VI. (REVOGADO)
§1°. (REVOGADO)
§2°. (REVOGADO)
§3°. (REVOGADO)”

“Art. 1.115 (…)

Parágrafo Único. (REVOGADO)”

“Art. 1.235 (…)

VII (REVOGADO)”

“Art. 1.330. (…)

I – Revogado.
II – Revogado.

Art. 2º. Este provimento entrará em vigor na data da sua publicação, após a apreciação e aprovação pelo Órgão Especial, conforme art. 29, Parágrafo único, inciso VI, alínea “q” do Regimento Interno do TJPE.

Recife, 14 de outubro de 2019

DES. FERNANDO CERQUEIRA NORBERTO DOS SANTOS
Corregedor-Geral da Justiça

PROVIMENTO APROVADO NA SESSÃO DO ÓRGÃO ESPECIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PERNAMBUCO EM 14 / 10 / 2019.

PROVIMENTO Nº 86, DE 29 DE AGOSTO DE 2019 – CNJ – PROTESTOS

PROVIMENTO Nº 86, DE 29 DE AGOSTO DE 2019.

Dispõe sobre a possibilidade de pagamento postergado de emolumentos, acréscimos legais e demais despesas, devidos pela apresentação de títulos ou outros documentos de dívida para protesto e dá outras providências.

O CORREGEDOR NACIONAL DA JUSTIÇA, usando de suas atribuições constitucionais, legais e regimentais e

CONSIDERANDO o poder de fiscalização e de normatização do Poder Judiciário dos atos praticados por seus órgãos (art. 103-B, § 4º, I, II e III, da Constituição Federal de 1988);

CONSIDERANDO a competência do Poder Judiciário de fiscalizar os serviços extrajudiciais (arts. 103-B, § 4º, I e III, e 236, § 1º, da Constituição Federal);

CONSIDERANDO a competência da Corregedoria Nacional de Justiça de expedir provimentos e outros atos normativos destinados ao aperfeiçoamento das atividades dos serviços extrajudiciais (art. 8º, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça);

CONSIDERANDO a obrigação dos serviços extrajudiciais de cumprir as normas técnicas estabelecidas pelo Poder Judiciário (arts. 37 e 38 da Lei n. 8.935, de 18 de novembro de 1994);

CONSIDERANDO os princípios da supremacia do interesse público, eficiência, continuidade do serviço público e da segurança jurídica;

CONSIDERANDO a necessidade de proporcionar a melhor prestação de serviço, com acessibilidade isonômica aos usuários, de corrigir as distorções em busca da modicidade dos emolumentos, da produtividade, da economicidade, da moralidade e da proporcionalidade na prestação dos serviços extrajudiciais;

CONSIDERANDO que “presumem-se a cargo do devedor as despesas com o pagamento e a quitação”, segundo a regra geral estabelecida no art. 325 do Código Civil;

CONSIDERANDO que a exigência de depósito prévio dos emolumentos e demais despesas devidas para o protesto extrajudicial é facultativa, consoante a inteligência do §1º do art. 37 da Lei Federal nº 9.492/1997;

CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal já definiu que o prazo para pagamento de tributos pode ser fixado em lei ou ato infralegal (STF, Pleno, RE 140.669, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 18/05/2001) e que o prazo para pagamento de tributos não se submete à anterioridade (STF – Súmula Vinculante 50);

CONSIDERANDO o decidido no Pedido de Providências n. 000049-07.2019.2.00.000,

RESOLVE:

Art. 1º Pelos atos que praticarem os Tabeliães de Protesto de Títulos ou os responsáveis interinos pelo expediente perceberão diretamente das partes, a título de remuneração, os emolumentos integrais a eles destinados, fixados pela lei da respectiva unidade da Federação, além do reembolso dos tributos, tarifas, demais despesas e dos acréscimos instituídos por lei a título de taxa de fiscalização do serviço extrajudicial, custas, contribuições, custeio de atos gratuitos, e à entidade previdenciária ou assistencial, facultada a exigência do depósito prévio.

Art. 2º A apresentação, distribuição e todos os atos procedimentais pertinentes às duplicatas escriturais (eletrônicas) e demais títulos e outros documentos de dívidas encaminhados a protesto por Banco, Financeira ou pessoa jurídica fiscalizada por órgãos do Sistema Financeiro Nacional, na qualidade de credor ou apresentante, independem de depósito ou pagamento prévio dos emolumentos e dos demais acréscimos legais e das despesas que estão contemplados no caput, cujos valores devidos serão exigidos dos interessados, de acordo com a tabela de emolumentos e das despesas reembolsáveis vigentes na data:

I – da protocolização, quando da desistência do pedido do protesto, do pagamento elisivo do protesto ou do aceite ou devolução de devedor;

II – do pedido de cancelamento do registro do protesto ou da recepção de ordem judicial para a sustação ou cancelamento definitivo do protesto ou de seus efeitos.

§ 1º As disposições do caput deste artigo aplicam-se:

a) às pessoas jurídicas fiscalizadas por agências que regulam as atividades de serviços públicos que são executados por empresas privadas sob concessão, permissão ou autorização, na qualidade de credoras, bem como aos credores ou apresentantes de decisões judiciais transitadas em julgado oriundas da Justiça Estadual, da Justiça Federal ou da Justiça do Trabalho e à União Federal, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e às suas respectivas Autarquias e Fundações Públicas no que concerne às suas certidões da dívida ativa.

b) a qualquer pessoa física ou jurídica desde que o vencimento do título ou do documento de dívida não ultrapasse o prazo de 1 (um) ano no momento da apresentação para protesto.

§2º Os valores destinados aos Ofícios de distribuição ou outros serviços extrajudiciais, aos entes públicos ou entidades, a título de emolumentos, custas, taxa de fiscalização, contribuições, custeio de atos gratuitos, tributos, ou de caráter assistencial, serão devidos na forma prevista no caput deste artigo, e repassados somente após o efetivo recebimento pelo Tabelião de Protesto.

Art. 3º Nenhum valor será devido pelo exame do título ou documento de dívida devolvido ao apresentante por motivo de irregularidade formal.

Art. 4º Os emolumentos devidos pela protocolização dos títulos e documentos de dívida que foram protestados nas hipóteses definidas no art. 2º e seu § 1º são de propriedade do tabelião de protesto ou do oficial de distribuição, quando for o caso, que à época praticou o respectivo ato.

Parágrafo Único. Na hipótese do caput deste artigo, caberá ao novo tabelião de protesto ou ao responsável interino pelo expediente perceber apenas os emolumentos devidos pelo cancelamento do registro do protesto e, também, transferir os emolumentos devidos pela protocolização para o tabelião de protesto ou o oficial de distribuição, quando for o caso, que à época o praticou, ou, ainda, para o seu respectivo espólio ou herdeiros, sob pena de responsabilidade funcional, além de outras sanções cíveis e criminais cabíveis.

Art. 5º Ficam os tabeliães de protesto ou os responsáveis interinos pelo expediente da serventia autorizados a conceder parcelamento de emolumentos e demais acréscimos legais aos interessados, através de cartão de débito ou de crédito, desde que sejam cobrados na primeira parcela os acréscimos legais que estão contemplados no art. 2º.

Art. 6º Os Estados e o Distrito Federal poderão estabelecer, no âmbito de sua competência, metodologia que preserve o equilíbrio econômico-financeiro do serviço público delegado, sem ônus para o Poder Público.

Art. 7º. Este provimento entra em vigor após decorridos 90 (noventa) dias de sua publicação oficial.

Brasília, data registrada no sistema.

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

Corregedor Nacional de Justiça

CNJ regulamenta serviços eletrônicos de tabeliães de protesto de títulos

Nesta quarta-feira, 11, o corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, assinou o provimento 87/19, que regulamenta a implantação do CENPROT – Central Nacional de Serviços Eletrônicos dos Tabeliães de Protesto de Títulos.

O documento estabelece definição de assinatura eletrônica. Segundo o texto, é uso de certificado digital que atende aos requisitos da ICP Brasil – Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira ou outro meio seguro, disponibilizado pelo tabelionato, previamente autorizado pela respectiva Corregedoria-Geral de Justiça.

A norma estabelece que a desistência do protesto poderá ser formalizada por meio eletrônico, sendo também admitido o pedido de cancelamento do protesto pela internet, mediante anuência do credor ou apresentante do título assinada eletronicamente.

CENPROT

A central será operada, mantida e administrada conforme deliberação da assembleia geral dos tabeliães de protesto de títulos, podendo ser delegada à entidade nacional representativa da categoria.

Além disso, a central deve disponibilizar, por meio internet serviços como: acesso a informações sobre quaisquer protestos válidos lavrados pelos Tabeliães de Protesto de Títulos dos Estados ou do Distrito Federal; consulta gratuita às informações indicativas da existência ou inexistência de protesto, respectivos tabelionatos e valor; fornecimento de instrumentos de protesto em meio eletrônico; recepção de declaração eletrônica de anuência para fins de cancelamento de protesto, entre outros.

Veja a íntegra do provimento.

Fonte: Migalhas

CSM/SP – Impossibilidade do exame de prescrição e decadência no âmbito da qualificação registral

Apelação Cível n.º 1000908-70.2019.8.26.0100

Apelante: Calminher S/A

Apelado: 9º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo

VOTO Nº 37.846

Registro de Imóveis – Tributos – Impossibilidade do exame de prescrição e decadência no âmbito da qualificação registral – Dever do oficial em exigir a prova do pagamento do ITBI – Especialidade objetiva – Descrição do imóvel imprecisa sem possibilidade de compreender sua exata localização – Necessidade de apuração do remanescente que não pode ser suprida por laudo de avaliação – recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta por Calminher S.A. contra r. sentença que julgou procedente a dúvida e manteve a recusa do registro de ata de assembleia geral por ausência de apresentação da guia do recolhimento do ITBI e violação ao princípio da especialidade objetiva.

A apelante sustenta a desnecessidade da prova do recolhimento do ITBI, ante a extinção de eventual crédito tributário e a possibilidade de localização do imóvel em razão de laudo de avaliação (fls. 211/220).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 235/237).

É o relatório.

É dever do registrador, nos termos do artigo 289 da Lei de Registros Públicos, fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício, portanto, correta a exigência atinente à comprovação do pagamento do ITBI.

Não é atribuição do Registrador, e tampouco deste órgão administrativo recursal, o exame da ocorrência de decadência ou prescrição de tributo com a finalidade de afastar a exigência da comprovação de seu pagamento.

O procedimento de dúvida, que é de natureza administrativa, tem por finalidade exclusiva a análise da dissensão entre o apresentante e o Oficial de Registro de Imóveis sobre os fundamentos adotados para a recusa do registro.

A par da natureza administrativa, o titular do crédito tributário não participa do procedimento de dúvida e, em decorrência, não pode ser atingido pelo pretendido reconhecimento da decadência. Ademais, em razão de sua natureza o procedimento de dúvida não comporta o chamamento do credor tributário para comprovar eventual causa interruptiva da prescrição.

Nesse sentido:

“Registro de Imóveis – Formal de Partilha – Ausência de recolhimento de Imposto de Transmissão “causa mortis” – Dever do Oficial de velar pelo recolhimento – Impossibilidade de reconhecimento de decadência ou prescrição pela via administrativa – Recurso desprovido.” (CSM, Apelação Cível n.º 1042731-63.2015.8.26.0100, Rel. Desembargador Pereira Calças).

O Princípio da Especialidade Objetiva, contido no art. 176 da Lei n.º 6.015/73, exige a identificação do imóvel como um corpo certo objetivando sua localização física.

No presente caso, em razão de várias alienações parciais há necessidade de apuração do remanescente. Assim, a descrição existente na transcrição é imprecisa e lacunosa, impedindo a identificação e exata localização da parcela do imóvel a ser transmitido.

Essa questão já foi objeto de precedente deste Conselho Superior da Magistratura, como se observa de extrato do voto do Desembargador Hamilton Elliot Akel, então Corregedor Geral da Justiça, na Apelação n.º 0010422-67.2013.8.26.0361:

“No que respeita ao principio da especialidade objetiva, ele apenas seria respeitado se o título descrevesse o imóvel tal como no assento e, também, se esse assento contivesse perfeita individualização do bem. Para Afrânio de Carvalho, o princípio da especialidade do imóvel significa a sua descrição como corpo certo, a sua representação escrita como individualidade autônoma, com o seu modo de ser físico, que o torna inconfundível e, portanto, heterogêneo em relação a qualquer outro (Registro de Imóveis: comentários ao sistema de registro em face da Lei 6.015/73, 2.ª ed., Rio de Janeiro, 1977, p. 219). Por isso, o imóvel deve estar perfeitamente descrito no título objeto de registro de modo a permitir sua exata localização e individualização, não se confundindo com nenhum outro. Narciso Orlandi Neto, ao citar Jorge de Seabra Magalhães, lembra que ‘as regras reunidas no princípio da especialidade impedem que sejam registrados títulos cujo objeto não seja exatamente aquele que consta do registro anterior. É preciso que a caracterização do objeto do negócio repita os elementos de descrição constantes do registro’ (Narciso Orlandi Neto, Retificação do Registro de Imóveis, Juarez de Oliveira, pág. 68). É certo que caberia mitigação no princípio da especialidade, caso o título – formal de partilha – espelhasse a antiga transcrição. Mas nem isso ocorre no caso. Enquanto a certidão oriunda do 1º registro de Imóveis menciona dois lotes de terreno, o formal de partilha, ao tratar de deles, discrimina-os como um só imóvel, não obstante a ausência de qualquer procedimento de unificação. E, mais, como ressalta o Oficial, traz medidas laterais inéditas, que não constam do assento. (grifo nosso) A situação não melhora com os documentos trazidos no curso do processo, que, de mais a mais, não integram o título e, portanto, não podem ser admitidos. Por meu voto, à vista do exposto, nega-se provimento ao recurso.”

O imóvel, com sua atual descrição, não permite individualização. Portanto, imprescindível apuração do remanescente para consecução da segurança jurídica do registro imobiliário.

No caso, não tem lugar a utilização de documentos diversos do título e do constante no registro imobiliário (laudo de avaliação) para identificação do imóvel, porquanto a localização deve ocorrer com os elementos existentes na serventia extrajudicial, daí a necessidade da apuração do remanescente.

Além disso, o laudo referido tinha finalidade de avaliar o imóvel e não estabelecer sua individualização para fins de registro imobiliário, em cumprimento ao princípio da especialidade objetiva.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: DJe/SP de 28.08.2019

PARTE DO JUDICIÁRIO JÁ ENTENDE QUE É POSSÍVEL A AUTORIZAÇÃO LIMINAR DO DIVÓRCIO

Curioso como o Judiciário por vezes busca soluções com a finalidade de gestão de passivo e agilização do trâmite processual e, por outras, esquiva-se de decidir, de plano, questões incontroversas, delongando desnecessariamente o período de tramitação de processos e pedidos que poderiam ser, desde logo, resolvidos.

Explica-se. Em algumas situações, com fundamento na elevada quantidade de processos e na alta taxa de congestionamento, o Poder Judiciário realiza interpretações de determinados institutos jurídicos, buscando viabilizar uma redução dos processos em tramitação ou uma maior celeridade dos feitos como, por exemplo, no uso mecânico de “precedentes”, embasado exclusivamente na aplicação de ementas descontextualizadas o que é facilmente constatado da análise do inteiro teor do julgado e de seus fundamentos determinantes.

Nessas hipóteses, a interpretação dada pelos tribunais é, inclusive, de duvidosa legalidade. Exemplo é o entendimento de algumas cortes no sentido de que seria possível a admissão do incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) em caráter preventivo, ou seja, sem a devida maturação da discussão nos tribunais, em uma interpretação incompatível com a própria natureza do instituto, previsto no artigo 927 do Código de Processo Civil[1]. Além disso, pode-se mencionar a vedação de acesso ao STJ e ao STF quando o recurso excepcional for inadmitido com fundamento em precedente firmado por tribunal superior[2].

Do mesmo modo, os inúmeros exemplos de jurisprudência defensiva, em que recursos deixam de ser admitidos, com fulcro em requisitos abusivos e, até mesmo, incompatíveis com a legislação vigente. É o que se depreende de casos em que recursos não foram conhecidos pelo Superior Tribunal de Justiça com base na ausência de comprovação de feriado local, sem que fosse dada oportunidade à parte recorrente de comprovar posteriormente a tempestividade de recurso, em patente violação aos artigos 932, parágrafo único, e 1.029, parágrafo 3º, do CPC/2015, e aos princípios da primazia do mérito e da instrumentalidade das formas, que orientam a ótica processual inaugurada com o novo diploma legal. Igualmente, pode-se mencionar a interpretação dada ao artigo 489, do CPC, no sentido de inadmitir recursos que não observem o chamado “ônus da dialeticidade”, ou seja, que não tenham impugnado especificadamente todos os fundamentos da decisão guerreada[3].

Por outro lado, existem casos em que o direito das partes é evidente e incontroverso, admitindo a aplicação de técnicas para a resolução imediata do conflito, como as tutelas provisórias — de urgência e evidência — e o julgamento antecipado de mérito, previsto no artigo 355 do Código de Processo Civil, e os julgadores deixam de utilizar tais institutos, obrigando as partes a estenderem a lide por um longo intervalo de tempo[4].

É o que se depreende, por exemplo, de ações de divórcio. O direito ao divórcio somente passou a ser previsto como causa de dissolução do vínculo matrimonial por meio da Emenda Constitucional 9/1977, sendo a questão posteriormente disciplinada pela Lei 6.515/77. Na época, foram impostos diversos entraves para a concessão do divórcio, como a exigência de que as partes estivessem separadas de fato pelo prazo de cinco anos, a necessidade de comprovação da causa da separação e a possibilidade de um único divórcio.

A partir da Constituição da República de 1988, a dissolução do casamento foi facilitada, com a redução do lapso temporal exigido para a concessão do divórcio[5] e a dispensa de qualquer discussão atinente aos fatos ensejadores da ruptura do vínculo conjugal, ou seja, à culpa pela separação.

E, a partir de 2010, por meio da Emenda Constitucional 66/10, que deu nova redação ao parágrafo 6º do artigo 226 da CF/88, o divórcio passou a depender de um único requisito, qual seja: a manifestação de vontade dos cônjuges, em atenção à autonomia privada das partes, restando eliminada a exigência de separação anterior.

Assim, o divórcio é um direito potestativo incondicionado, respaldado por norma constitucional, que o autoriza independentemente de qualquer prova ou condição, sendo dispensada, inclusive, a formação do contraditório, uma vez que o único elemento necessário à sua concessão é a manifestação de vontade de um dos cônjuges.

Constata-se, portanto que a cognição da ação de divórcio já se inicia com maturação suficiente para o deferimento da antecipação dos efeitos do pleito de dissolução do vínculo conjugal, de modo que não é razoável impor ao demandante o ônus de suportar a morosa tramitação do feito para que, só ao final, tenha apreciada sua pretensão, quando já houver manifestado inequívoco interesse em se divorciar.

Por esta razão, entende-se ser plenamente possível a concessão da tutela de evidência para que seja, liminarmente, decretado o divórcio entre as partes, com fulcro no artigo 311, incisos II e IV do Código de Processo Civil, tendo em vista a inconteste evidência do direito material do demandante, por se tratar de alegação comprovada apenas documentalmente (para tanto, basta a juntada da certidão de casamento e a manifestação de vontade da parte autora), com respaldo em norma de índole constitucional.

Perceba-se que o fundamento do instituto da tutela da evidência é assegurar a antecipação de efeitos em hipóteses nas quais há a presunção de uma cognição maturada pelas hipóteses normativas apresentadas no artigo 311, CPC. Na hipótese em comento, como já se evidenciou estamos diante de um quadro normativo mais inconteste ao se vislumbrar um direito potestativo previsto no texto constitucional, qual seja, o direito incondicionado de se divorciar.

Neste mesmo sentido, já se posicionou o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam)[6], que considera possível a concessão liminar do divórcio por meio da tutela de evidência, por ser este um direito potestativo que pode ser exercido unilateralmente por qualquer um dos membros do casal.

Ressalte-se que a concessão da medida liminar, nesta hipótese, vai ao encontro tanto dos ensejos da parte, que não mais anseia a vida comum, quanto do Judiciário, que, desde logo, poderá resolver o conflito entre os litigantes, ao menos neste aspecto.

Contudo, apesar de toda a matriz constitucional e legal ora exposta, já se conhece casos em que o pedido de tutela de evidência, formulado nos autos de ação de divórcio, foi indeferido, sob o fundamento de que não estariam presentes as hipóteses autorizadoras da medida, contidas no artigo 311, do CPC, postergando a análise do pleito incontroverso para após a formação do contraditório, em contrariedade aos anseios da parte, ao princípio da celeridade processual (artigo 4º, CPC) e aos próprios interesses de gestão do passivo processual do Poder Judiciário.

Felizmente, em que pese o entendimento mencionado acima, parte do Judiciário, atenta à ótica processual instaurada pelo Código de Processo Civil de 2015, bem como à normativa constitucional atinente à questão, já compreende que é plenamente possível a autorização liminar do divórcio. A propósito, vale mencionar julgados dos tribunais de Justiça de São Paulo[7], da Bahia[8] e do Paraná[9].

Por este mesmo motivo e, ainda, buscando reduzir a entrada de novos processos no Poder Judiciário, o Tribunal de Justiça de Pernambuco editou o Provimento 06/2019[10], para regular o chamado “divórcio impositivo”, possibilitando que mesmo o divórcio não consensual fosse obtido de forma unilateral, no cartório de registro civil em que foi registrado o casamento, instaurando nova hipótese de autotutela. De forma contraditória com os próprios anseios de aumento da eficiência do Judiciário, a Corregedoria Nacional de Justiça determinou que o provimento fosse revogado, obstando o divórcio extrajudicial quando ausente consenso entre as partes.

Percebe-se, em síntese, que o Poder Judiciário adota uma postura paradoxal: em alguns casos, opta por interpretações restritivas de direitos assegurados em lei, buscando lidar com o quadro de litigância de massa constatado no país; em outros, deixa de resolver, de plano, pretensões fundadas em direitos assegurados constitucionalmente, delongando desnecessariamente a discussão e contribuindo para o próprio congestionamento de processos em trâmite nas cortes.

Certo que não existem soluções simplistas para lidar com o problema complexo da conjuntura atual do Poder Judiciário. Todavia, medidas pontuais podem contribuir, ainda que minimamente, para uma maior celeridade processual, assim como para melhor atender os interesses dos cidadãos em juízo, verdadeiros protagonistas do sistema processual.

Referências:

[1] Tratamos dos problemas do IRDR preventivo em outra sede. NUNES, Dierle; MARQUES, Ana Luiza Pinto Coelho Marques; WERNECK, Isadora Tófani Golçaves Machado; FREITAS, Laura . O perigo da utilização estratégica do IRDR por litigantes habituais e a necessidade dos tribunais refletirem sobre sua cooptação: a proibição do incidente preventivo e o caso samarco. In: Paulo Henrique dos Santos Lucon; Pedro Miranda de Oliveira. (Org.). Panorama atual do novo CPC 2. 1 ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2017, v. 2.
[2] Este entendimento prevaleceu no julgamento do AREsp 1.170.332/SP, em decisão monocrática proferida pelo ministro Luis Felipe Salomão. Esta questão foi abordada em: NUNES, Dierle. FREITAS, Marina Carvalho. O STJ e a necessidade de meios para superação dos precedentes. Revista Consultor Jurídico – CONJUR. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-nov-22/opiniao-stj-meios-superacao-precedentes>.
[3] Fala-se mais detidamente sobre os problemas da interpretação do STJ em relação ao ônus da dialeticidade em: NUNES, Dierle. VIANA, Aurélio de Souza. Ônus da dialeticidade: nova “jurisprudência defensiva” no STJ? Revista Consultor Jurídico – CONJUR. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-mai-15/onus-dialeticidade-jurisprudencia-defensiva-stj#sdfootnote1sym>.
[4] Nesse sentido, vale destacar que os processos de conhecimento no Brasil tramitam, em média, por 2 anos e 2 meses até a sentença e por 2 anos e 9 meses até a baixa, conforme Justiça em Números 2018: ano-base 2017/Conselho Nacional de Justiça – Brasília: CNJ, 2018.
[5] Conforme redação original do art. 226, §6º, da CR/88, “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos”.
[6] A propósito ver: TOSCANO DE BRITO, Rodrigo. Divórcio impositivo. Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/noticias/6950/Div%C3%B3rcio+impositivo#_ ftn1>. No mesmo sentido: <http://ibdfam.org.br/noticias/5924/CPC+de+2015+torna+div%C3%B3rcio+imediato>.
[7] TJSP; Agravo de Instrumento 2109708-24.2018.8.26.0000; Relator(a): José Carlos Ferreira Alves; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Privado. Data do Julgamento: 9/8/2018; Data de Registro: 9/8/2018.
[8] TJBA. Processo 051810766.2013.8.05.0001. Juiz Alberto Raimundo Gomes dos Santos. 6ª Vara de Família Suces. Orfãos Inter. e Ausentes. J: 26/6/2014.
[9] TJPR. Processo 0022222-37.2015.8.16.0188. Juíza Joseane Ferreira Machado Lima. 2ª Vara de Família e Sucessões de Curitiba. J: 10/5/2018.
[10] http://www.tjpe.jus.br/documents/10180/2109879/DJ89_2019-ASSINADO.Divorcio.pdf/f0827abf-3108-a325-9165-55faae56dd03

*Dierle Nunes é sócio do Camara, Rodrigues, Oliveira & Nunes Advocacia (CRON Advocacia), doutor em Direito Processual, professor adjunto na PUC Minas e na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Membro da Comissão de Juristas que assessorou na elaboração do CPC/2015 e diretor acadêmico do Instituto de Direito e Inteligência Artificial (Ideia).

**Ana Luiza Marques é advogada do Camara, Rodrigues, Oliveira & Nunes Advocacia (CRON Advocacia) e membro do Grupo de Pesquisa Processualismo Constitucional Democrático e Reformas Processuais.

Fonte: Conjur (08/08/2019)