SENTENÇA: MARIA DE LOURDES DE SANTANA, propôs a presente AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO em face de ANTÔNIA GERMANIA DE SANTANA e SEVERINO JOSÉ DE SANTANA. A autora alega que reside no imóvel situado na Rua Amália, nº 215, Cordeiro, Recife-PE, desde o ano de 1979, quando se imitiu na posse do mesmo, e lá formou família e criou seus filhos, mantendo desde o início a posse mansa, pacífica, contínua, ininterrupta e sem oposição de terceiros. Tal terreno, no entanto, está registrado em nome dos réus, genitores da autora. Segundo a demandante, desde que ela se imitiu na posse do terreno objeto da ação, juntamente com seu esposo, já falecido, possuiu o animus domini, construiu o imóvel nele existente, realizou as benfeitorias necessárias para a sua manutenção e pagou o imposto predial, a conta de energia e a de água. Diante do acima exposto, ela requereu a declaração em seu favor do domínio do imóvel usucapiendo conforme descrito nas plantas de levantamento da arquitetura e nas informações constantes de seu registro cartorário, a expedição de mandado para que o 4º Cartório de Registro de Imóveis promova o registro da aquisição pleiteada e a averbação da construção descrita na inicial, como “habite-se judicial”. Requereu, também, os benefícios da justiça gratuita. O Juízo deferiu o pedido de gratuidade e determinou a citação dos réus (incertos e não sabidos), dos confinantes e das Fazendas Municipal, Estadual e Federal. Foi publicado edital citando os réus, os confinantes não localizados e eventuais interessados incertos e não sabidos, fls 199-202. As fazendas públicas manifestaram ausência de interesse na demanda, conforme ofícios de fls.138/146/306. Tanto os réus quanto os confinantes foram citados pessoalmente ou por meio de seu representante legal, fls. 92/136. Os réus apresentaram contestação às fls. 96-101, arguindo preliminarmente inepcia da inicial sob o fundamento de que a autora não possui legitimidade para requerê-lo por não preencher os requisitos legais para a aquisição por meio de usucapião nem possuir animus domini. Meritoriamente, eles afirmaram que a autora jamais teve a posse mansa e pacífica do bem objeto da lide. Isso, porque, inicialmente o referido imóvel pertencia à avó materna da autora, que a cedeu em comodato, quando essa última casou, até que ela e seu esposo se organizassem financeiramente para pagar o aluguel. Posteriormente, com a morte da avó da demandante, a propriedade do terreno foi transferido em partilha para a ré, mãe da autora. Durante todo esse período a demandante permaneceu no mencionado terreno, apesar de os réus ressaltarem que o mesmo não lhe pertencia. A autora apresentou réplica, fls. 158-194. Em agosto de 2016, foi informado nos autos o falecimento do réu SEVERINO JOSÉ DE SANTANA, e requerida a habilitação dos seus herdeiros. Tal pedido foi deferido. Foi realizada audiência de instrução e julgamento, em 18/07/2017, com oitiva das partes e testemunhas, fls. 384-396. A autora e os réus apresentaram razões finais, fls.428-470 e 556-561, respectivamente. Vieramme os autos conclusos. É o que importa relatar. Passo a decidir. De início, observo que a preliminar apresentada pelos réus se confunde com o próprio mérito, motivo pelo qual decido a matéria quando enfrentar o mérito da demanda. A usucapião extraordinária, prevista no art. 1.238 do CC/2002, tem como requisitos legais a posse mansa e pacífica do imóvel, com anumus domini, independentemente de justo título e boafé, pelo período de 15 anos. Tal prazo pode ser reduzido para 10 anos, caso o usucapiente resida habitualmente no imóvel ou nele desenvolva atividade produtiva. Conforme acima relatado, a autora afirma que ganhou da sua avó o imóvel objeto da lide, como presente de casamento, e nele habita desde 1979, com anumus domini, sempre de forma mansa, pacífica, ininterrupta e sem oposição de terceiros, motivo pelo qual propôs a presente ação. Analisando os autos, porém, observa-se que inexiste qualquer documentação que comprove a mencionada doação bem como inexistentes testemunhas que tenham presenciado o fato. Assim, não se desobrigou a autora do ônus da prova previsto no art. 373, I do CPC/2015, correspondente ao art. 333 do CPC/1973. Ademais, percebe-se no documento de fls. 129-131, na ação de separação judicial proposta pela autora em face de seu ex-esposo, o reconhecimento, por ela, de que ambos possuiam apenas um bem e que o imóvel situado na Rua Amália, nº 215, Cordeiro, Recife-PE pertencia aos réus. Ou seja, a autora reconheceu nos autos do processo de separação que o bem perseguido não é seu e sim de seus pais, restando, assim demonstrada a inexistência do animus domini. Além disso, apesar de a autora afirmar que era dona do mencionado bem, ela o ocupou, inicialmente, com autorização da sua avó e nele permaneceu com a permissão dos seus pais, aqui réus. A autorização e a permissão concedidas à autora e a sua família para permanecerem no imóvel decorreram de mero ato de tolerância da sua vó e dos seus pais, respectivamente, estes últimos titulares do direito sucessório, inexistindo assim posse, mas sim mera detenção, fato impeditivo da usucapião. Conforme dispõe o art. 1.208 do CC/2002, os atos de mera tolerância, que consistem em permissão tácita para que o outro utilize a coisa por cortesia, não induzem a posse, mas a mera detenção. Sendo este o entendimento jurisprudencial. In verbis: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. COMPOSSE. HERDEIROS. PERMISSÃO DE MORADIA. ANIMUS DOMINI. INEXISTÊNCIA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. MAJORAÇÃO HONORÁRIOS. 1. São condições para aquisição de imóvel por usucapião, seja na modalidade especial, seja na extraordinária, o animus domini daquele que exerce a posse sobre o bem usucapiendo e a ausência de interrupção ou oposição.2. O exercicio da posse como se dono fosse é afastada quando o possuidor está autorizado por meio de negócio juridico ou outro ato de consentimento a ocupar o imóvel, ainda que tenha se empenhado a conservar e aperfeiçoar o bem com desejo de se converter em proprietário. 3. A permissão dos demais herdeiros do bem, compossuidores deste, para a ocupação do imóvel, ainda que por longo tempo, configura ato de mera tolerância, que afasta o animus domini e, consequentemente, impede a usucapião.4. À luz do §11, do art. 85 do NCPC, os honorários devem ser majorados, em face da sucumbência recursal resultante de não provimento do recurso. 5. Recurso conhecido e não provido. (TJDF – 20110112220703 DF 0213032-36.2011.8.07.0001, Relator: Ana Cantarino, Julgado em 09/11/2017, Órgão julgador 8ª Turma Cível, Publicado em 16/11/17).(grifei) Portanto, a mera tolerância dos réus impede a autora de ter a posse do bem, inexistindo assim o preenchimento deste requisito da usucapião. Por fim, após determinado período os réus solicitaram à autora a desocupação e devolução do bem, havendo, desde então, em decorrência disso, desavenças familiares, o que demonstra que quando a autora manifestou a intenção de tomar posse do bem, houve resistência por parte de seus legítimos proprietários, daí não haver a posse mansa e pacífica. Ante os fatos e fundamentos acima expostos, resta demonstrada a inexistência da posse mansa, pacífica, com animus domini e sem oposição de terceiros, motivo pelo qual JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC. Condeno a autora ao pagamento das custas processuais bem como dos honorários advocatícios, que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa acima fixado, com as correções de direito, com fundamento no art. 98, §2º do CPC. A execução das custas e dos honorários, no entanto, ficará sobrestada por cinco anos, até a comprovação de que a beneficiária perdeu a condição de miserabilidade, nos termos do art. 12 da Lei 1.060/1950 c/c art. 98, §3º do CPC. P.R.I. Após o decurso do prazo legal, certifique-se o trânsito em julgado, promovam-se as baixas, e, ao final, arquivem-no. Recife, 12 de novembro de 2019. Julio Cezar Santos da Silva Juiz de Direito Sentença Nº: 2019/00138 Processo Nº: 0042508-22.2014.8.17.0001 Natureza da Ação: Usucapião Autor: MARIA DE LOURDES DE SANTANA Réu: ANTONIA GERMANIA DE SANTANA Réu: SEVERINO JOSE DE SANTANA Advogado: PE008177 – Miraldo José da Silva Réu: Maria José de Santana Réu: Maria Helena de Santana Cavalcante Réu: Maria das Graças Dias de Santana Réu: Maria dos Prazeres da Silva Réu: MUNICIPIO DO RECIFE Réu: SEVERINO JOSÉ SANTANA FILHO Réu: MARIA LINDALVA DE SANTANA GONÇALVES Advogado: PE020519 – ANTONIO CARLOS DA C. L. CAVENDISH MOREIRA